ABRUPTO |
semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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25.7.08
NOTA INTRODUTÓRIA A STANLEY KUBRICK (Edição Cahiers du Cinema / Público) O que é que fica dos filmes na nossa cabeça? Os filmes? Quando os estamos a ver, são os filmes. Em particular, a primeira vez que os estamos a ver, esse momento único e irrepetível em que o cinema manda em nós no escuro e nos leva para onde não sabemos que vamos. Depois, começa o trabalho da memória, a grande recolectora das coisas que nos importam, boas, más e péssimas. Ficam momentos dos filmes, coisas dos filmes, imagens, cenas, canções, faces dos actores, cenários, efeitos especiais. Na nossa cabeça cada vez há menos narrativas, cada vez mais há fragmentos, vírus, slogans, “experiências”. Kubrick deixou como poucos atrás de si dezenas e dezenas destas “lembranças”: o chupa-chupa, os óculos, as unhas da Lolita; o fabuloso Hotel por onde passa o fabuloso Jack Nicholson possesso, um dos melhores cenários de qualquer filme de sempre; o dr. Strangelove entusiasmado como as personagens de Sade pelo poder da destruição, e o cowboy da bomba, o reverso farsante do trágico-cómico Peter Sellers; o olhar daqueles olhos maquilhados debaixo de um improvável chapéu de coco, na Laranja Mecânica, o olhar que desejamos ardentemente nunca ver; e HAL, no 2001, Odisseia do Espaço. Os diálogos de HAL 9000, o computador da nave, feito numa fábrica de Urbana, Illinois, em 12 de Janeiro de 1992, quando mata e quando morre, são um dos momentos mais dramáticos da história do cinema: de um lado uma voz que é ao mesmo tempo a mais próxima e a mais alheia. Uma voz que diz a mais humana das frases, a mesma que Cristo na cruz, “tenho medo” e depois delira: HAL: (…) My instructor was Mr. Langley, and he taught me to sing a song. If you'd like to hear it I can sing it for you. Dave Bowman: Yes, I'd like to hear it, HAL. Sing it for me. HAL: It's called "Daisy." HAL: Daisy, Daisy, give me your answer do. I'm half crazy all for the love of you. It won't be a stylish marriage, I can't afford a carriage. But you'll look sweet upon the seat of a bicycle built for two. Só no cinema. Só no cinema feito por Kubrick. (url)
© José Pacheco Pereira
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