ABRUPTO

29.7.08


KARL MARX E O SEU DESTINO

Apresentação a Marx, Manifesto do Partido Comunista / Manuscritos Económico-Filosóficos de 1844 / O Capital (Edição Popular), 2008 (edição internacional distribuída pelo Diário de Notícias).

(...) Marx continua por todo o lado, mas está muito diferente daquilo que foi. A impregnação do marxismo em tudo, a começar pelo “texto escolar” e pelo discurso comunicacional, tornou-se tão normal, tão habitual que temos dificuldade em distingui-lo da “ideologia dominante” que ele esconjurava. É um marxismo deslavado, desprovido das suas intenções revolucionárias, longe dos seus actores históricos, transformado num mero discurso sobre a sociedade, sobre o conflito, sobre os “ricos e os pobres” já sem esse nome, perpassando no discurso da alter-globalização, nos debates sobre o preço do petróleo, mesmo nalguma vulgata ecológica, nas discussões esquerdistas sobre o Império. Deslavado, descaracterizado, mas também marxismo.

Marx continua forte nos livros de sociologia e de economia, menos forte nos de filosofia, menos nos de política. Na academia, o seu sucesso segue uma geografia bizarra, forte nos campus das universidades americanas, em França, na América Latina, mas esse marxismo universitário que ainda alimenta algumas revistas com o seu nome, já não é o mesmo Marx do “marxismo” que conhecíamos. Não é o mesmo Marx de Engels, de Lenine, de Staline, de Cunhal, mesmo de Lukács, Garaudy e Althusser, mas um Marx intelectualizado, transfigurado em mil teorias críticas que, do cinema ao feminismo, da antropologia bosquímana aos estudos de arquitectura apocalíptica, continuam a produzir centenas de livros e milhares de artigos por ano.

A Internet está também cheia de Marx, mas acompanhado agora pelos vários marxismos que o fim do comunismo deixou de considerar desviantes. Onde antes estava um Marx solitário, lido numa linha única por Engels, Lenine, e Staline, propriedade dos partidos comunistas que simbolicamente o tinham colocado numa estátua no centro de Berlim Leste e lhe publicavam a Marx-Engels-Gesamtausgabe (MEGA), a edição estandardizada dos textos, entre as academias de Moscovo e Berlim, há agora o Marx do Internet Marxist Archive, que inclui o caribenho C.L.R. James, o americano branco Hal Draper, o indiano Roy, os “esquerdistas” e conselhistas alemães e holandeses, os bordiguistas italianos, Gramsci, Guevara, Rosa Luxemburgo, mil e uma vozes que se digladiaram entre si, exactamente pela interpretação que faziam de Marx. Como deixou de haver uma legitimidade política da interpretação, primeiro em 1960 com o conflito entre o PC da China e o PC da União Soviética, quando Marx era único e tinha uma linha de interpretadores autorizados, passou-se para uma multidão de vozes, afro-caribenhas, indías, feministas, homossexuais, chinesas, anarco-comunistas, marxistas-libertárias, marxistas críticas, psico-marxistas, etc., etc., todas dele se reclamando

(Texto integral a ser colocado nos Estudos sobre o Comunismo em breve.)

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© José Pacheco Pereira
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