ABRUPTO

28.6.08


NUNCA É TARDE PARA APRENDER: 272 PALAVRAS DITAS NUM CEMITÉRIO RURAL (4)

Garry Wills, Lincoln at Gettysburg: The Words that Remade America, Simon & Schuster, 2006.

Para Lincoln (e muitos dos Transcendentalistas seus contemporâneos) os EUA não eram uma nação como as outras, mas a encarnação de um "sentido" (a propositon). Exactamente por isso, Lincoln valorizava e muito as palavras, interessava-se pelas palavras de uma forma precisa, estudava gramática, a que atribuia uma exactidão semelhante à das demonstrações de Euclides. O outro orador, Everett , tinha estudado filologia na Europa, na tradição alemã. Por isso, um homem que considerava importante "preparing the public mind" deu todo o sentido à sua breve intervenção no cemitério quando falou da luta dos que tinham morrido por "a new nation, conceived in Liberty, and dedicated to the proposition that all men are created equal." A chave do discurso de Gettysburg não é a "liberdade", nem a "emancipação", é a "igualdade". É à "igualdade" que é dedicada a "nova nação",- os EUA não tinham ainda cem anos, - e esta reinterpretação histórica, política, constitucional, presa à Declaração da Independência
We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness.
Ditas num momento de grave crise nacional, elas escolhem um caminho e excluem outros. Nas suas 272 palavras, Lincoln "fez" os EUA num segundo acto fundador e, como o primeiro, em guerra.

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Há um aspecto do discurso de Lincoln em Gettysburg que julgo que merece ser mencionado. É considerado um dos grandes discursos da história e, tendo esta opinião sido repetido há muito tempo e por muita gente qualificada para tal, poder-se-ia pensar que sempre foi assim considerado. Por isso, vale a pena ler o comentário que o Chicago Times fez ao discurso: «A face de cada americano deve estremecer de vergonha à medida que ele lê estas afirmações patetas, banais e entediantes vindas do homem que é descrito a estrangeiros inteligentes como o Presidente dos Estados Unidos da América.» Estas unanimidades surgem sempre depois, não na época em que os eventos têm lugar.

(José Carlos Santos)

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