O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: RETRATOS DO TRABALHO NOS ANOS SESSENTA
Conhecendo o seu interesse por imagens do trabalho em Portugal, venho enviar-lhe fotografias que descobri nos arquivos do meu pai (de autor desconhecido, certamente um fotógrafo profissional local), relativos a uma empresa têxtil pertencente e dirigida (à distância) por suecos que apenas periodicamente se deslocavam a Portugal, as “Confecções Norsel”. Concebida de raiz e instalada em Coimbrões (V N Gaia), começou a laborar em 1964, com condições de trabalho raras na época (incluindo semana de 42 horas quando vigorava a de 48 horas, refeitório, assistência médica, actividades recreativas e um modelo de relação nivelada entre administração e funcionários). Em 1977 foi vendida ao grupo suíço Kispo mas ao fim de alguns anos entrou em decadência como a maioria das têxteis nacionais.
O meu pai, que chefiava o escritório, um candeeiro de um design incrível e os objectos datados como carimbos, mataborrões, telefones, etc. Penso que é uma foto já dos anos 70, ao contrário das que se seguem que são todas dos anos 60.
Todo o pessoal da empresa, incluindo os 2 suecos que a dirigiam (o 3º homem a contar da esqª e a senhora loira que no meio das costureiras segura um ramo de flores).
A zona de produção.
Um dos passeios que anualmente a empresa oferecia aos funcionários: a gestora sueca (ao centro, com flores) rodeada de costureiras com indumentárias e cortes de cabelo típicos dos 60’s.
A sala de reuniões com os 2 gestores suecos e na parede o mapa da Suécia.
Mais um passeio, desta feita de ferry a Bayona, com Stª Tecla ao fundo, cremos nós.
Outro passeio, de barco, na antiga Barrinha de Esmoriz (a gestora sueca sempre no meio das costureiras, de quem era muito querida)
Passeio a Coimbra, gestores sempre em confraternização com funcionários
No porto de Caminha (provável) o Mercedes sueco onde seguiam familiares dos gestores.
(Mónica Granja)
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Sobre a empresa sueca onde o meu pai trabalhou e à qual reportam as imagens no post do Abruto enviadas pela minha irmã Monica, gostaria de acrescentar os seguintes factos que a meu ver, completam as imagens,
Os suecos disponiblizavam uma verba mensal fixa a ser distribuida por instituições de solidariedade social locais (Gaia)
Os suecos logo nos primeiros tempos ofereceram ao meu pai uma viagem a Londres e à Suecia o que lhe permitiu alargar horizontes. Esta iniciativa, numa época em que viajar de avião pela Europa era muito pouco vulgar em Portugal, diz muito sobre a forma como viam o negócio.
Porque desde miudo frequentei a "fábrica do meu pai" e privei com os administradores, cresci a pensar que as fábricas deveriam ser todas assim. Anos mais tarde apercebi-me da triste realidade da maioria das empresas portuguesas e quão previligiado tinha sido quem de algum modo trabalhou ou privou com aqueles suecos.
Os ordenados pagos a todo o pessoal estavam claramente acima da média dos sector à época. As diversas corporações do sector não viam com bons olhos esta prática dos suecos e faziam questão de o demonstrar sempre que podiam.
(nuno g)
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Há algum tempo, perguntava-me uma colega, professora universitária, em que “o” levava a palavra “álcool” o acento. Já tinha discutido o assunto com outro colega e não tinham chegado a conclusão nenhuma.
Lembrei-me nesse dia da minha professora primária (agora, de forma politicamente correcta, diz-se professora do ensino básico) que, para nunca o esquecermos, nos ensinara que a sílaba que leva o acento é a sílaba tónica e que esta se determina imaginando que chamamos um amigo à distância, com o nome da palavra cuja tónica pretendemos descobrir. A sílaba onde pararmos mais tempo nesse chamamento é a tónica. Portanto, bastava imaginar o meu amigo “Álcool” do outro lado da rua e chamá-lo: «Ó ÁLLLLLLLLLLLLLLLLcool, anda cá», para perceber que em “álcool” a sílaba tónica é “al”, recaindo no “a” o acento.
Apesar do carácter exclusivamente lúdico que o ensino assumiu nas últimas duas décadas, parece que já ninguém ensina nem aprende estes jogos e as novas gerações crescem sem saber que “álcool” não leva acento em “o” nenhum.
Trago aqui este assunto, porque, acabada a 4.ª classe, nunca mais vi ou ouvi falar da minha professora primária. Passaram cerca de 40 anos. Hoje, com profunda surpresa, descubro publicadas no “Abrupto” as fotos de uma fábrica têxtil em Vila Nova de Gaia, enviadas precisamente pelos filhos da minha professora primária, a Mónica e o Nuno Granja.
Acho que minha geração nunca disse à geração da mãe da Mónica e do Nuno, o “OBRIGADO!” que lhe deve. Pertencemos à última geração que pode poupar dinheiro, dispensando a compra de um software de correcção ortográfica. Pelo menos, pertencíamos, até chegar o novo acordo luso-brasileiro.
Se o “Abrupto” estiver aberto à criação de uma rubrica intitulada “Grandes Carros” (à semelhança das “Grandes Capas”), talvez a Mónica e o Nuno Granja tenham nos seus arquivos a foto de um risível “NSU Prinz”.