ABRUPTO |
![]() semper idem Ano XIII ...M'ESPANTO ÀS VEZES , OUTRAS M'AVERGONHO ... (Sá de Miranda) _________________ correio para jppereira@gmail.com _________________
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10.2.08
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10:01
(JPP)
NÃO, NÃO ESTAMOS NOS NOSSOS MELHORES DIAS ![]() A colheita dos últimos dias "verdeja" à superfície de coisas um pouco sinistras: o processo de Isaltino de Morais voltou quase à estaca zero, mais uma vez, ao fim de não sei quantos anos, e não acontece nada. Vários crimes de que era acusada Fátima Felgueiras prescreveram entre os passeios pelo Brasil, as mudanças de visual e as peregrinações a Fátima dos felgueirenses, patrocinadas pela "Fatinha". E não acontece nada. O Ministério Público arquivou o processo de agressões ao vereador de Gondomar, continua a não se saber quem o agrediu, mas isso não deve ter importância, porque não acontece nada. Cravinho faz uma crítica duríssima aos seus colegas de bancada por sabotarem qualquer legislação contra a corrupção. E não acontece nada. De passagem, o mesmo Cravinho põe em causa com todas as letras o comportamento do LNEC, a quem acusa de ter moldado as conclusões às vontades do poder político, falsificando o seu relatório sobre o aeroporto por omissão de despesas. E não acontece nada. O bastonário da Ordem dos Advogados falou alto de mais e obrigou a mais uma ronda de lip service sobre a corrupção dos ricos e poderosos, que muito provavelmente vai dar origem a mais uma... Comissão. E não acontece nada. O mesmo bastonário acrescentou um caso muito interessante de como se ganha dinheiro em Portugal, o prédio vendido de manhã pelo Estado aos privados e vendido à tarde pelos privados a outros privados com mais cinco milhões em cima e, pelo meio, consultores e assessores do PS e do PSD. E não acontece nada. O Público mostrou a obra arquitectónica do engenheiro Sócrates, (vale a pena este vídeo) por coincidência toda no distrito da Guarda, apesar de ele ser funcionário da Câmara da Covilhã e dirigente partidário do distrito de Castelo Branco. E não acontece nada. Depois, há o ciclo do governo PSD/PP com os seus sobreiros, submarinos e um casino dado numa noite de despachos que adormeceu ainda com o governo Santana Lopes/Portas e acordou com o governo do engenheiro Sócrates, porque era o dia do fim dos tempos, o Gotterdamerung da coligação despedida por Sampaio e por milhões de portugueses. E não acontece nada. Do lado do "dar" está o Estado, do lado do "receber" está a Estoril-Sol, os Espírito Santo, a Lusoponte, o Futebol Clube Felgueiras, etc., etc. Não, não estamos nos nossos melhores dias... ![]() Numa daquelas reviravoltas que a moda faz à história, sim, que a história é muito de modas, passou-se da versão carbonária à versão ao modo do Senhor Dom Duarte Nuno. Tudo isto a propósito desse bom homem que matámos há cem anos, o Rei D. Carlos, agora o Senhor Dom Carlos, Rei de Portugal. Uma pequena multidão descobriu as maravilhas da monarquia, muda o nome de Ataíde para Athayde, de Rui para Ruy, passeia o seu blaser nos grandes escritórios de qualquer coisa burocrática que eles acham que não é burocrática, negócios, auditoria, advocacia, aconselhamento fiscal, project finance, com o emblema da Causa Monárquica na lapela, dobrando a voz todas as vezes que diz Senhor, como em Senhor Dom Carlos, indo a missas para esconjurar os jacobinos e os carbonários, convencidos de que os regicídas eram a encarnação da Al-Qaeda da época e que Portugal seria um grande país caso não houvesse aqueles tiros junto ao Tejo. Para o resto, peguem numa lupa e vão ver as fotografias dos "palácios reais", as fotografias dos grandes e médios eventos desses anos finais da monarquia e podem continuar pela República e pelo Estado Novo dentro e vejam o Portugal que lá está ao lado da Família Real nos vasos partidos segurados com arame, nas louças com "gatos", nos jardins pouco cuidados, nos espelhos com a prata gasta, nas roupas puídas e usadas, nas decorações erguidas de madeira e papelão, no tom de abandono, descuido e pouca limpeza, que nem a hierarquia do upstairs e do downstairs servia para funcionar bem, não porque não houvesse muita criadagem, mas porque faltavam os mordomos ingleses. Esse mundo que tomam por brilhante e cosmopolita era o mesmo Portugal que hoje pretendem esconjurar porque "feio, porco e mau", o mesmo Portugal - oh sinistro adjectivo! -, "piroso", de que pensam fugir conhecendo os vinhos de casta, comprando relógios Patek Philipe para entesourar, caçando vestidos de duendes verdes, fazendo subir o preço do Almanaque de Gotha nos leilões, e passeando-se por resorts e spas. Não, não estamos nos nossos melhores dias... Salva-nos o mundo? Não, não salva, a não ser que Barack Obama, que em Portugal tem o maior número de admiradores por metro quadrado da Costa Leste dos EUA para cá, ganhe as eleições. Obama, aquilo que a esquerda europeia pensa que é a esquerda americana, é a última esperança do mundo, tão esperançosa que levou muita gente a trair os Clinton, aquilo que a esquerda europeia pensava que era a esquerda americana antes de Obama aparecer. Soares vota em Obama, Jorge Coelho vota em Obama, Marcelo vota em Obama, o BE vota em Obama, as redacções da TSF, da RTP, da SIC, do Diário de Notícias, votam em Obama. E as outras também. Pensam que Obama vai lá chegar e com a varinha mágica da Utopia e da Esperança, o seu grande mérito a julgar pelos comentários, vai acabar com a guerra no Iraque, a Al-Qaeda, a recessão e as lojas dos chineses, reconhecer a União Europeia como parceira mundial dos EUA e propor Barroso para o Prémio Nobel, dizer "porreiro, pá" ao nosso engenheiro, reconciliar Mário Soares com os EUA e pôr ordem nos israelitas. Está bem, está na altura de acordar, mas como é que se pode acordar quando toda a gente quer continuar a sonhar? Não, não estamos nos nossos melhores dias... (Versão do artigo do Público de 9 de Fevereiro de 2008.) (url)
© José Pacheco Pereira
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