ABRUPTO

29.2.08


COISAS DA SÁBADO: A SITUAÇÃO DE REVOLTA NAS ESCOLAS



No caso do Ministro da Saúde a contestação era maior na rua do que no interior do “sistema”, no caso da Ministra da Educação é o contrário. A situação nos dois ministérios “reformistas” do governo Sócrates tinha por isso uma diferença fundamental e levou ao despedimento do Ministro da Saúde e à manutenção da Ministra da Educação. No entanto, com a deterioração acelerada da situação no interior das escolas já estive mais seguro de que ninguém tocaria na Ministra do que estou hoje.

Não é que o Ministério da Educação não tenha simpatias do seu lado e poderosas: muitas pessoas estão com a Ministra, pais, autarcas, “povo”, porque se revoltavam com a situação das escolas, por muitas e diferentes razões, mas unidos num único alvo, os professores. Os professores no seu conjunto eram tidos como os grandes responsáveis pelo que se passava nas escolas e embora houvesse outros alvos, o Ministério, o laxismo, o “eduquês”, os sindicatos, acabava sempre por sobrar para os professores. Os professores tinham uma óbvia responsabilidade por esta situação e tinham-se posto a jeito. Embora houvesse professores que individualmente expressassem o seu descontentamento com o “eduquês”, o facilitismo, a falta de hierarquia de mérito entre os próprios professores, o absentismo, o desleixo e a má preparação de muitos profissionais, a ausência de avaliação digna desse nome, a sindicalização do Ministério, não havia um sólido movimento de opinião entre os professores que exigisse reformas e isso permitiu a demonização dos professores enquanto classe profissional. Mas havia professores com estas preocupações e estes deveriam ser os aliados naturais de uma política de reformas como a que a Ministra quis realizar. Só que não há, não há ninguém, é difícil encontrar alguém, em qualquer escola do país, que apoie a Ministra, que é universalmente odiada pelos professores. Uso a palavra forte, “odiar”, porque é raro encontrar algum responsável ministerial mais sozinho que a Ministra da Educação e isso, por si só, mostra que alguma coisa falhou nas suas reformas, porque, por escassos que fossem, alguns aliados deveriam existir, 10%, 5% dos professores, 3 ou 2% para se conseguir ter sucesso.

Onde estão os erros? Um, de primeira responsabilidade de Sócrates, foi fazer reformas “contra”, usar, para obter apoio popular fácil, o mecanismo de pôr juízes contra professores, professores contra médicos, pais contra os professores, cada classe ou grupo contra os “privilégios” dos outros, e o “povo” contra todos. É bom para as sondagens, é péssimo para fazer reformas. Esta linguagem agressiva das reformas “contra” os grupos profissionais também penetrou no Ministério e, feito o mal, a seguir não é possível controlar os estragos. Depois, o Ministério, que é uma burocracia que se comporta como burocracia, quis fazer tudo ao mesmo tempo, dispersou-se e desconcentrou-se, misturou coisas importantes com irrelevâncias, atirou para todo o lado, e, sem dar espaço às escolas e aos professores para se adaptarem a uma nova ecologia, logo surgia outra alteração e outra e outra. Muita coisa foi feita de forma incompetente, gerando injustiças flagrantes em processos muito delicados, criando divisões e hostilidade entre professores, despromovendo carreiras profissionais altamente qualificadas a favor de critérios apenas centrados no dar aulas, actuando de uma forma sentida como punitiva contra os professores. O Ministério alienou os apoios dos melhores e mais dedicados professores e não conquistou o apoio de nenhuns outros.

A Ministra bem pode mandar, como Jeová, os Anjos a Sodoma e Gomorra à procura de um justo, que não encontra ninguém. Pode-se dizer que isto acontece porque são mesmo verdadeiras reformas e atingem o cerne do corporativismo dos professores, o que é em parte verdade, mas escapa à questão de fundo: muitas reformas foram mal conduzidas, mesmo quando tinham mérito de per si e o resultado pode apenas ser mais caos e esvanecer-se junto com a Ministra.

A janela de oportunidade está quase fechada, o tempo é escassíssimo, mas só uma pessoa pode ainda tentar salvar o que se pode salvar: a Ministra da Educação. Não é “ceder” que se lhe pede, é que distinga o que é essencial do que é secundário e se concentre, concentre, concentre, no que é essencial e deite o resto pela borda fora. Já.

*
(...) concordo em grande parte com o seu texto sobre a "A SITUAÇÃO DE REVOLTA NAS ESCOLAS". Permita-me, porém, como professor do ensino secundário, dizer-lhe que também existem na escola professores do lado das politicas educativas deste Ministério da Educação. Mas, confesso, não somos muitos.

De facto, ao que parece, a classe docente anda revoltada. A julgar pelas conversas nas salas de professores, e pelas manifestações “espontâneas” que por aí se preparam, nunca, como hoje, a contestação a este governo e à Ministra da Educação foi tão unânime e incisiva por parte dos professores.

Nos últimos tempos muito se tem dito e ouvido sobre a Avaliação do Desempenho dos Professores. Há ano e meio atrás, a maior parte dos professores dizia-se contra qualquer avaliação de desempenho que fugisse dos termos da que era feita na época, ou seja, que interferisse com a progressão automática nas carreiras que, como alguns sabem, assegurava a todos, sem distinção, ao fim de uns anos o topo da carreira, isto é, um ordenado de € 2900 (ilíquidos) por 12 horas semanais de trabalho lectivo. Agora, percebendo que não têm argumentos que sustentem o facto de não quererem ser avaliados, dizem que, afinal, querem ser avaliados mas não nos moldes que a regulamentação do Ministério da Educação definiu.

Todos sabemos que a avaliação dos professores, tal como a dos alunos, é de elementar justiça e fundamental para valorizar o empenhamento e premiar o mérito, visando, dessa forma, a melhoria das aprendizagens e resultados. Contudo, isso não é suficiente para que os professores a desejem e aceitem. Muito menos para os sindicatos, através dos seus milhares de agentes impregnados nas escolas, deixarem fugir esta oportunidade de fazerem figura perante os seus líderes partidários. Afinal, qual seria o professor que aceitaria de bom grado, de um dia para outro, o incómodo e a preocupação de prestar contas pelo trabalho realizado ao longo do ano lectivo, ainda por cima com implicações na progressão na carreira? Certamente muito poucos.

Por agora, o objectivo de alguns professores e sindicatos é, tal como ouvi ontem na voz de um colega, "dar cabo da ministra antes que ela dê cabo de nós". Por isso que os argumentos contra a regulamentação da Avaliação de Desempenho dos Professores, assim como as providências cautelares interpostas pelos sindicatos e as mega manifestações previstas, são apenas fogo de artificio para nos entreter em discussões demagógicas e vãs que visam apenas e só adiar a implementação da avaliação e deixar tudo como está.

Sejamos claros, a reforma em curso na educação é difícil, com óbvios custos políticos, e envolve mudanças profundas na cultura das nossas escolas que, sem margem de dúvida, afectam os interesses e expectativas dos professores. Contudo, são reformas imperativas a bem do país, que só não foram feitas há muitos anos por falta de coragem política dos governos anteriores.

João Filipe Marques Narciso (Prof. de Matemática do 3º Ciclo e Ens. Secundário)

*

A questão da avaliação dos professores está na ordem do dia, em várias partes do mundo, não apenas por cá. As politicas que por cá se estão a aplicar são já prática em vários lados e com resultados duvidosos. Um dos aspectos é a utilização dos resultados dos alunos na avaliação dos docentes, que apesar de polémica poderá sob controlo ser um aspecto a considerar. No entanto não me queria perder em aspectos técnicos numa questão que é meramente politica.

É curioso que nenhum partido ou politico venha a terreno explicar claramente o que está em causa, ou por ventura ficar ao lado dos que entendem que avaliação docente não pode ser feita nos moldes da que é realizada numa empresa. Para começar uma escola não é uma empresa e em segundo lugar o que está em causa é a concepção da verdadeira escola pública. Hoje (ainda) último reduto da liberdade. A escola que pretendem asfixiar e domar colocando-a ao serviço do governo (este ou outro) é algo muito desejado e claramente rejeitado por qualquer sistema que respire livre da coacção. Não será por acaso que as politicas reformistas da educação em países como os EUA falharam toda ao longo do sec.XX.

Os professores ao contrário do que por aí se vai dizendo não são corporativistas, muito pelo contrário. Estão desunidos por vários (imensos) sindicatos; uma diversidade imensa quanto à sua proveniência (Engenheiros, advogados, farmacêuticos, médicos e mais recentemente professores) e dispersos por niveis de ensino com especificidades próprias (ensino artístico, educação infantil, primeiro ciclo, ensino profissional, etc). O problema é que não há politico, por mais impoluto que seja, que não deseje domar esta força de influencia junto das massas. Talvez por isso nunca tenha sido concedido aos professores uma ordem, que regulasse a profissão a nível deontológico. A questão fulcral do insucesso reside em aspectos até simples de solucionar, houvesse verdadeira vontade em os resolver. Mas acredite não é necessário hierarquias para manter uma escola, pelo contrário. Quanto a carreira deixe-me dar-lhe um esclarecimento - até agora um professor determinava a carreira que tinha e era remunerado por isso. Se supervisionava estágios , presidia a um executivo era por que era capaz e se empenhava, caso contrário abandonava as suas funções e regressava a soldado.

Na verdade a escola que hoje está moribunda é libertária e não opressiva e em breve teremos uma escola opressiva, regulada pelos poderes politico-partidários. Existiam obviamente entorses que deveriam ter sido resolvidas à muito tempo. Nem tudo estava bem, mas acreditem que vai ficar pior. acredito porém que nem tudo será mau a classe passará realmente a existir - este é o ano do nascimento de uma nova classe em Portugal a da classe docente.

(...) de um docente consciente da sua primeira função,

(Carlos Brás)

*

Efectivamente, a Ministra perdeu os professores e é pena.Porque, estando em causa o ensino e a educação, está em causa o futuro do país. A actividade docente, porque é uma actividade que implica relações humanas, precisa de um clima de serenidade e confiança entre os vários intervenientes. Ora, as injustiças e o desassossego, entretanto criados com os atropelos à lei, com o aumento da burocracia, com a overdose legislativa (e mal escrita) e com um comportamento de desconfiança e frequentemente acintoso relativamente aos docentes não se apagam, da mente, com um simples delete. Mais, mesmo que nos queiramos abstrair, tudo isso emerge quando menos esperamos e contamina, como um veneno, as melhores boas intenções. Os professores não são todos bons profissionais, é evidente, mas a maioria é-o. E as actuais políticas educativas não estão a separar o trigo do joio. Pelo contrário, está-se a deitar fora a criança com a água do banho. Má estreia, diria o Eça pela voz do Afonso da Maia.

(Nelsa Neves, professora.)

*

Hesitei em comentar o artigo porque efectivamente não sinto a obrigação de convencer ninguém. Quem trabalha diariamente nas escolas são todos aqueles que lá estão; todos os outros não podem opinar sobre aquilo que não sentem, não sofrem e não sabem como funciona. A tentação é sempre usar o chavão do corporativismo mas isso aplica-se transversalmente a toda a sociedade: desde os políticos que governam até a todas as profissões. Quem tem de defender as condições dignas de trabalho são os agentes aos quais é aplicado esse trabalho. Na docência estas condições pioraram (perdeu-se o direito à maternidade, paternidade, luto de familiares, casamento) com mais horas lectivas semanais (horas extra não remuneradas), mais turmas em escolas com a mesma dimensão e equipamentos (os cursos profissionais, Novas Oportunidades), etc.

Treinadores de bancada hà muitos mas só um é que comanda a equipa; como é possível opinar sem conhecer os elementos técnicos da avaliação de desempenho? Quando os conhecerem, concluirão que é humanamente impossível aplicá-los nos moldes em que estão propostos. Os parâmetros criados são a porta aberta à arbitrariedade, discricionariedade e perseguição, que em nada estão relacionados com qualidade do desempenho. O exemplo da escola de Leiria (com parâmetros em que avaliavam a verbalização da opinião dos professores), aliado ao novo modelo autocrático de gestão das escolas, é paradigmático do que irá acontecer a médio prazo em termos de avaliação; se o oito é mau, o oitenta é pior.

Como é possível aceitar tacitamente a divisão dos professores em 2 categorias quando executam exactamente as mesmas funções e muitas vezes em conjunto?
Nunca houve progressão automática porque os professores só progrediam se cumprissem uma série de requisitos; se era eficaz, é um assunto que teria de ser discutido na mesa técnica. O que é garantido, é que com esta avaliação NINGUÉM progride, nem maus e nem bons, por imposição de quotas cegas.
Agora não “são sempre os mesmos”, parafraseando o primeiro-ministro; são muitos que nunca na sua vida profissional se manifestaram (eu incluído), mas que atingiram o limite da humilhação a que têm sido sujeitos.
Toda a revolta espontânea que surgiu, ao arrepio dos sindicatos, apenas teve como causa as muitas injustiças e ilegalidades descaradas do ME em relação a milhares de professores; e a injustiça é a mãe de todas as revoltas.

(Mário Silva)

*

Sou um professor titular do ensino básico. Tenho 30 anos de serviço docente. Não sou nem nunca fui militante de nenhum partido político. Tenho cumprido regularmente a minha obrigação cívica e democrática de exercício do voto, tanto na escolha dos deputados nacionais, como na dos deputados europeus e municipais, de acordo com as minhas opções políticas e ideológicas e as minhas preferências partidárias.
Tenho-me sentido incomodado e ofendido pela forma superficial e pouco séria como a generalidade dos meios de comunicação social e em particular alguns jornalistas e opinion makers vêm abordando o conflito entre professores e o governo, reduzindo tudo a querelas partidárias e sindicais.

(Francisco José Santana Nunes dos Santos)

*

Sobre a questão da Avaliação de Desempenho dos professores, gostaria de lhe pedir para se debruçar um pouco sobre a ficha de avaliação imposta aos Conselhos Executivos (CE) para poderem avaliar todos os docentes. A partir desses itens os CE têm de estabelecer os padrões de referência/perfis de desempenho que acabam por ser impossíveis de
quantificar.como por exemplo este:

Indicadores de medida:

. nº de projectos e actividades desenvolvidas no âmbito do PEE, PAA e PCT

. nº de projectos e actividades que coordenou

. nº de actividades em que o docente não participou sem qualquer justificação relevante

. cumprimento dos objectivos previstos na actividade/projecto

. natureza da actividade/projecto

. relevância dos projectos e actividades desenvolvidas

. qualidade na supervisão das AEC (1º ciclo)/componente de apoio à família (Pré-Escolar)

Padrões de referência/perfis de desempenho (para os indicadores acima
mencionados):

C.1.1.1.1 – O docente empenhou-se em muitas (mais de 10/ano) e relevantes actividades/projectos, coordenando pelo menos uma delas/ano
introduzindo aspectos inovadores no desenvolvimento das mesmas

C.1.1.1.2 – O docente empenhou-se em bastantes (mais de 5/ano) e
relevantes actividades/projectos, coordenando pelo menos uma delas/dois
anos e, quando não participou, justificou tal facto de forma plausível

C.1.1.1.3 – O docente empenhou-se em algumas (mais de 3/ano) actividades/projectos

C.1.1.1.4 – O docente não se empenhou grandemente nas actividades/projectos


Se reparar, é pedido a cada docente, para obter a pontuação máxima, que se envolva em 10 actividades relevantes, coordenando pelo menos uma delas. Se pensar numa escola com 60 professores, poderá acontecer de num ano lectivo, a escola desenvolver 600 projectos ou actividades. Como poderá o CE medir o empenhamento e a relevância dessas mesmas actividades? Como se dimensiona o empenhamento e a relevância se à partida todos os docentes promoveram a actividade para resolver um problema? Estas actividades têm sempre como um fim levar os alunos a empenhar-se num determinado problema constatado por eles. Vamos supor que o problema para um determinado grupo de alunos era o lixo acumulado no recreio. O
docente implementou com os seus alunos um projecto de sensibilização para o problema e desenvolveu-o durante o ano conseguindo que esse problema desaparecesse. Um outro professor, desenvolveu um projecto de expressão dramática e levou os seus alunos a dramatizar uma obra. Essa obra foi depois levada para o exterior, envolvendo os pais na confecção de roupas etc... Esta actividade foi muito mais visível, mas será que promoveu nos alunos mais competências?
Como será que o CE vai decidir qual a mais relevante? Para mim a 1ª é muito mais relevante, mas menos visível. Será que a relevância se vai confundir com visibilidade?

Outro problema nesta avaliação está na contradição entre os normativos e depois os itens. Por ex: na educação especial o normativo 3/2008 refere que cabe ao docente titular de turma a coordenação e implementação do Plano Educativo Individual (PEI), mas é o professor de Ed. Esp. que é avaliado pelo resultado do mesmo. Ainda no que refere à Ed. Esp, no meu agrupamento de escolas, cada professor tem em média 12 alunos, tendo apenas uma carga horária de 2 horas semanais com cada aluno. Como pode um professor implementar um PEI com esta carga horária?

(H)

*

(...) no que diz respeito à Educação, permita-me que discorde em parte consigo. 20 anos de ensino, algumas leituras e reflexões dar-me-ão alguma autoridade para opinar sobre o assunto, o que lamento não ser o caso de toda a gente neste país. Somos um povo de "palpitadeiros", perdoe-me o neologismo.

A Educação estava de facto mal, toda a literatura científica sobre o assunto apontava nesse sentido. Os problemas estavam bem identificados nos extensos estudos que foram publicados sobre a Educação do "antes". Porque não duvidemos, haverá uma educação do "antes" e do "pós" era Socrática...

O que mais me tem confundido, e me leva a partilhar a opinião de um trio ministerial autista aos reais problemas da educação é esse mesmo: a incapacidade (ou recusa?) em reconhecer os bloqueios de um sistema de educação dos mais adiantados em termos teóricos e dos mais ineficientes em termos de aplicação.

O problema podia também estar ao nível dos professores, mas não estava só. Posso apontar vários aspectos que funcionavam mal, mas que não irão melhorar. Este ministério ignorou-se, ou subverteu-os atribuindo a responsabilidade da sua inoperância aos professores. O objectivo é claro, tal como no sector da saúde: privatizar, privatizar, privatizar. A política não é o meu forte, e nem irei por aí, mas essa não é a minha concepção de escola. A escola é de todos e para todos.

A avaliação dos alunos não estava adequadamente implementada. O reforço da importância dos exames para o rigor (rigor de quê?!), não a veio melhorar de forma alguma. A avaliação dos professores, que sempre existiu, nunca foi devidamente aplicada. A formação que permitia aos professores progredirem na carreira era aprovada e frequentemente paga pelo estado. Os formadores eram acreditados pelas estruturas do estado. Os professores não melhoravam as suas práticas, a formação estava frequentemente desfasada das necessidades do sistema, sabiam-no? Porque não respeitar as regras do jogo, nomeadamente incumbindo as Escolas Superiores de Educação da formação contínua, finalidade para que foram criadas e não para formação de professores 2 em 1?

A Educação Especial não funcionava ou funcionava mal pontualmente? Porque não aplicar a lei e recorrer às estruturas existentes (Coordenações das Áreas Educativas, Equipas de Coordenação da Educação Especial) para pôr ordem no sector. É claro que tal implicaria que prevalecessem critérios de competência e não políticos para a escolha dos coordenadores. Do tempo do governo PSD / CDS-PP, foi caricato, em certas Coordenações e Direcções Regionais, o baile de cadeiras para a divisão dos lugares entre estes dois partidos. Mudámos para um governo PS, recomeçou o bailinho das estruturas...

Seria exaustivo enumerar todos os problemas, que foram pura e simplesmente postos de lado, é mais fácil culpar os professores: a fixação geográfica dos professores, a falta de equipas multidisciplinares para quebrar o isolamento da escola face aos desafios da era moderna (indisciplina/ violência, drogas, famílias destruturadas, instabilidade económica, que se foi aliás agravando com este governo. Se a escola já não lhe respondia antes, imagina-se agora...)

A situação está à imagem do debate dos prós e contras: a Ministra bate no ceguinho, alguns professores emitem barbaridades sem se aperceberem sequer disso, e o professor Formosinho procura defender que se calhar o que está mal é a própria estrutura da escola. Dizia ele : porquê haver turmas? A escola está em mudança é urgente adaptarmo-nos às necessidades criadas. A escola tem de mudar.

A minha opinião é: mimem os professores, dêem-lhes formação adequada, acompanhem-nos, dêem-lhes condições físicas, materiais e psicológicas, ajudem as famílias. E depois exijam. Exijam. Eu agradecia. Sentir-me ia mais amparada, e talvez reconhecessem finalmente o valor dos bons.

(Conceição Faustino)

*

Em 2006, relendo o “Estado de Sítio” de Albert Camus, senti como proféticas estas palavras relativamente:

a) aos professores:

"Nada: (...) imaginam que tudo está na ordem. Não, vocês não estão na ordem, vocês estão na fila. Bem alinhados, de ar tranquilo, vocês estão maduros para a calamidade. (...) Quanto ao resto não se incomodem , há quem se ocupe de vocês lá em cima. E vocês sabem o que isso dá: os que se ocupam de nós não são complacentes!

b) à Ministra da Educação:

A Peste: Eu reino, é um facto, é por consequência um direito. Mas é um direito que não se discute: vós deveis adaptar-vos.”

“A Secretária: A nossa convicção é que vocês são culpados.

(«Temos professores a mais e com fracas competências», dizia a Ministra em Maio de 2006)

(...) É preciso ainda que vocês próprios se sintam culpados. E não se sentirão culpados enquanto não se sentirem fatigados. Estamos a fatigá-los, eis tudo. Quando estiverem derreados de fadiga, o resto irá por si.”

Para terminar, e também sobre a avaliação:

"(...) e as avaliações e os exames diminuem as poucas forças internas capazes de mobilizar os indivíduos, (...) Longe de lhe [à sociedade portuguesa] insuflar força anímica, retiram-lhe energia, envergonham-na sem a estimular."

(Portugal Hoje, O Medo de Existir, José Gil, Relógio D'Água, p. 82)


Rui Monteiro (professor de Educação Tecnológica na EB 2,3 Luís de Sttau Monteiro, Loures)

*

Há quase vinte anos que estou na educação, nunca fiz uma greve, não sou militante de nenhum partido e nunca fui a uma "manif ". A minha carreira profissional teve início no ensino privado, onde permaneci cerca de dez anos. O que oferecia eram baixos salários, pouco investimento na formação dos docentes. A situação económia estava sempre à frente do investimento ao nível pedagógico. Considerei que tinha chegado a hora de sair.

Ao optar por passar para o ensino público, verifiquei melhorias a nível salarial, mas um sistema pouco receptivo a mudanças, burocrático e instalado. Os colegas que estavam ligados aos sindicatos tinham ainda mais regalias, as avaliações de desempenho, pouco assertivas, em suma a escola existia mais para os professores e menos para os alunos.

Era importante mudar, ajustar, fazer alterações. Surgiram os agrupamentos de escolas e as alterações pouco a pouco tornaram-se visiveis. No entanto era necessário continuar com as mudanças, fazer reformas, mexer em interesses instalados.

Quando este governo começou a fazer alterações, considerei que as mudanças seriam graduais, apesar de não sentir grande empatia pelo PM. Começam as revogações das leis, alterações nos concursos, surgem as extras currículares, as aulas de substituição e ninguém esclarecia ninguém, tudo era imposto,

Instalou-se a incerteza, o medo, o sentimento de injustiça e por fim a revolta. O autoritarismo, a falta de diálogo, leis atrás de leis, sem qualquer espaço nem termpo, para as aplicar.

Estatísticas sem veracidade ao nível do conteúdo, combate ao insucesso e abandono escolar, com conteúdos programáticos sem qualquer exigência, desordem total!

Retirei, como mãe, a minha filha das extra currículares, por não existirem condições, nem ao nível das estruturas fisícas, nem técnicos qualificados, estes, arranjados à pressa pelas Associações de Pais e Câmaras Municipais, enfim um verdadeiro depósito. Por fim a cereja no bolo, acabar com ATLs porque os pais saiem todos do trabalho às 17h30, foi genial!

Vou para a rua, vou pela 1ª vez a uma "manif" porque considero que "não é com vinagre que se apanham moscas", farta de mentiras, de injustiças, de pagar cada vez mais impostos e ter de reduzir cada vez mais, em quase tudo. Ver reduzir o IVA nos ginásios, quando o leite, o pão, as papas e os bens essenciais das crianças a subir.

Familías cada vez mais necessitadas e medidas sociais, que apenas contribuem para a maior produção de crianças nas classes mais desfavorecidas com o objectivo de irem buscar subsídios. O resultado são o aumento das crianças em centros de acolhimento, para adopção. Aumento do número de contribuiçóes do já pouco dinheiro dos contribuintes.

Trabalhar! Sempre o tenho feito e farei enquanto conseguir e for útil, porque a reforma está longe e provavelmente inexistente, mas desta forma, para chegar onde?

Vou em protesto, vou! Contra todos os políticos, que estão instalados na carreira e nada mais fazem do que proteger os seus interesses, marionetas dos grandes grupos económicos. Para onde nos vão levar, onde fica a nossa cultura? O nosso contexto social? Para onde foi parar o referendo, para passarmos a ser uma federação da Europa, o sonho de Robert Schuman e Jean Monnet.

A comunicação social sem qualquer independência, com reportagens só aceites pela censura "socrátrica". As maiorias são perigosas, porque eles vêm disfarçados de D. Sebastião, que nunca mais voltou, porque não chegou a partir, está em cada um de nós, nas nossas consciências, nos nossos valores éticos, no altruismo e sentido de justiça.

Maria B. Campos (Educadora de Infância )

Etiquetas:


(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]