ABRUPTO

5.2.07


NUNCA É TARDE PARA APRENDER: JUSTIÇA DOS VENCEDORES?

http://www.pocketessentials.co.uk/images/large/1903047501large.jpgJustiça dos vencedores? Sem dúvida, mas não só. Li este pequeno livro de Andrew Walker à luz do julgamento de Saddam Hussein, para ver onde é que as diferenças eram evidentes. Não apenas para ver as diferenças, mas para perceber onde elas pesavam. A conclusão é obvia: o julgamento de Saddam teria sido o equivalente a colocar apenas os comunistas alemães ou os russos a julgar Göring e os outros réus. Quase tudo a que do império da lei e do direito (de alguma lei pelo menos), ou seja de "justo", se assistiu no julgamento de Nuremberga deveu-se aos juízes das democracias aliadas que não aceitaram todas as acusações, deram condições de trabalho à defesa, e decidiram inclusive absolvições. A grande diferença entre Nuremberga e Bagdad tem a ver com o facto de Saddam ter sido julgado por iraquianos em vez de o ser por juízes das forças de ocupação. É pouco provável que Saddam escapasse à pena de morte, como Keitel, Jodl, Rosemberg, Ribbentrop e outros também não escaparam, mas teria sido um julgamento mais sério. Claro que não serviria para nada a curto prazo, porque na guerra do Iraque há pouco "high moral ground", tal decisão seria sujeita a outro tipo de acusações, e, com a guerra civil em curso, pouco adiantaria. Mas serviria para o "moral ground" do futuro.

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Um dos factos a que se aludiu no julgamento foi a queima por soldados e oficiais alemães da biblioteca de Tolstoy para se aquecerem. Quando alguém objectou, um oficial alemão respondeu que "gostava de se aquecer à luz da literatura russa".

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Na defesa das SS, para efeito do veredicto sobre quais eram ou não as "organizações criminosas", uma das testemunhas aludiu às boas condições no campo de concentração de Buchenwald que, entre outras coisas, teria um bordel. Um dos juízes não percebeu a palavra e pediu que fosse repetida. Pela segunda vez não percebeu. O seu colega do lado, que já lhe estava a sussurrar que se tratava de bordel, chegou-se ainda mais e ligou o microfone inadvertidamente enquanto lhe diz "ó homem, bordello, bordel, casa de putas". Foi uma das raras ocasiões em que todos se riram.

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Relativamente à comparação entre os julgamentos de Nuremberga e o de Saddam Hussein, estou de acordo consigo quando afirma que houve mais seriedade no primeiro do que no segundo. E, acrescento, também houve mais seriedade nas execuções. Mas convém não esquecer que Saddam Hussein foi apenas um de oito réus e que não foram todos condenados à morte. De facto, houve três condenações à morte, uma condenação a prisão perpétua, três penas de quinze anos de prisão e, inclusivamente, uma absolvição (por falta de provas).

(José Carlos Santos)

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