ABRUPTO

1.2.07


NUNCA É TARDE PARA APRENDER: A "CULPA" É MESMO DE LEO STRAUSS?

http://yalepress.yale.edu/YupBooks/images/full/0300109733.jpg Duvido, duvido muito e depois de ler este livro ainda duvido mais. A "culpa", esclareça-se, é a "culpa" do "império", de Bagdad, da hostilidade anti-árabe, de responsabilidade dos "neo-cons", essas personificações modernas do Dr. Strangelove.

Este é um daqueles livros que numa ou noutra página, conseguem mostrar uma grande qualidade analítica e depois falhar o ponto essencial: mostrar até que ponto existe uma relação entre os ensinamentos de Leo Strauss, o seu grupo de discípulos e o chamado neo-conservadorismo que teria dominado a presidência "imperial" de Bush filho. É um livro muito bem escrito, fluente, rápido, cheio de insights e pequenas histórias académicas típicas do mundo das grandes universidades americanas, mas está longe de corresponder à tese do título.

Não é que não haja relações e influências entre Leo Strauss e os seus alunos "imperialistas", como aliás acontece com outros autores e académicos europeus e americanos, só que nunca é clara no livro a relação de causa. O ponto é tanto mais falhado quanto sempre que Anne Norton vai mais fundo no pensamento de Strauss (por exemplo na importância que atribuía a autores como Maimónides ou al-Farabi na construção de uma ciência política) mais distante este aparece do neo-conservadorismo dos seus alunos. Strauss, um judeu fugitivo da Europa, como Hannah Arendt, sempre se preocupou com a difícil junção entre a Atenas racional e a Jerusalém da revelação, com o estado totalitário nazi e comunista, e isso foram antídotos contra tomar à letra a dicotomia "amigo/inimigo" como fundadora da política, que importara de Schmitt. Talvez seja por isso que o livro é mais sobre os "straussians", descritos quase como uma seita maçónica, do que sobre Strauss.

Sobre os "straussians", Anne Norton, ela própria aluna de Joseph Cropsey, autor com Strauss da History of Political Philosophy, consegue uma leitura que oscila entre uma atracção que não consegue evitar, tal o brilhantismo e a seriedade intelectual e académica de muitos deles, e a recusa da sua política, ou do que interpreta como sendo a sua política. É nessa contradição que se encontram as melhores páginas deste livro, como quando escreve sobre o papel da guerra
"Strauss saw, as Nietszche had before him, hazards in the softness and civility of modern life.(...) Such a life, as Nietszche, Schmitt. Strauss and Kojève feared, was a life of small pleasures and small ambition, few risks and few achievements, few dangers and little greatness of soul. The old virtues of courage and daring would be lost. people bred to so quiet life would be as cats are to tigers, tamed and diminished."
e, logo em seguida, em resposta, Norton escreve uma apologia do "Last Man" da democracia, "ordinary people who will take on the burdens of greatness at need (...) Democracy has thaught them that honour is greater than glory". Analisando o conservadorismo americano das últimas décadas, Norton revela bem algumas das suas contradições e algumas das suas peculiaridades especificamente americanas - o seu "revolucionarismo", por exemplo, muito pouco conservador, e que chocaria os seus congéneres europeus se os houvesse - mas não escapa à amálgama e à facilidade como quando compara alguns autores como Perle, Kristol e Wolfovitz ao pensamento da Al-Qaida e ao fundamentalismo muçulmano. (E no entanto quando fala da jihad, quase que acerta porque o conceito islâmico é bem menos simples do que se pensa e aplica-se como uma luva a alguns textos neo-conservadores...)

Etiquetas: ,


(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]