ABRUPTO

5.1.07


COISAS DA SÁBADO: A ETA E ZAPATERO

http://external.cache.el-mundo.net/elmundo/imagenes/2006/03/25/1143280123_1.jpgZapatero andou a brincar com o fogo espanhol mais intenso e antigo: a unidade do Estado. É uma velha história espanhola, mais ligada às raízes do conflito civil, e do conflito civil máximo que foi a guerra de 1936-9, do que parece, submergido que foi numa memória construída apenas na antinomia, fascismo-comunismo, ou em outras variantes do mesmo. Basta conhecermos na sua integridade o celebre episódio da Universidade de Salamanca entre Unamuno e Millan Astray para perceber como a “questão nacional” é vital na compreensão da Espanha. Zapatero, louvado por cegueira pelos nossos socialistas lusos, tem tentado activamente destruir duas políticas de Aznar que serviam Espanha: uma, a afirmação da Espanha na cena internacional e europeia, que correspondia ao vigor e pujança da economia e da sociedade espanholas; outra, uma política de intransigência com o terrorismo basco.

Saliente-se que em muitos aspectos estas políticas de Aznar eram sucedâneos de políticas de González. As políticas de Aznar continham riscos e foi aos erros assentes num desses riscos que ele ficou a dever a sua abrupta queda e o afastamento muito significativo do PP da opinião pública e do poder. Mas Zapatero fez e está a fazer pior: está a abalar a unidade do Estado espanhol caminhando para um ponto sem retorno a toda a velocidade. E esse ponto sem retorno será em Espanha não um momento pacífico, mas sim o soltar de todos os demónios. De novo.

O atentado da ETA só o podia surpreender a ele, e mostrou a enorme irresponsabilidade do caminho negocial que iniciou com o terrorismo, não a partir de uma posição de força, mas sim de fraqueza. Agora, a meio do caminho, o governo perdeu toda a legitimidade para tratar da questão basca, e o terrorismo da ETA, sendo o que foi sempre, mostrou as garras que nunca perdeu.

*
Em primeiro lugar gostava de pedir desculpas pelo meu português. Não concordo com o ponto de vista sobre Zapatero no assunto da ETA. A questão é muito complexa para um post de um blog, mas gostava de salientar algumas coisas:

- O problema dos nacionalismos na Península Ibérica é muito antigo e é um problema que ainda não ficou perfeitamente resolvido. Não sei se sabe que o hino de Catalunha faz referência a factos acontecidos em 1640 (Não é um ano especial para Portugal?) O dia Nacional de Catalunha faz referência a factos acontecidos em 1714. EM Aragão ainda fazemos homenagem ao chamado Justiça de Aragão, assassinado por Filipe I (II em Castela) no século XVI. Em resumo: As tensões territoriais é um problema que passa de geração em geração e que sofre momentos de imenso centralismo acompanhados de autonomismo. A única parte da Espanha da que falava o Conde de Barcelos na Crónica Geral e que conseguiu independência chama-se Portugal. Foi por essa independência que hoje existe uma cultura portuguesa e uma língua portuguesa forte no mundo. ( Não sei se sabe que os professores do franquismo batiam nas crianças que falavam na aula na língua das mães galegas, bascas ou catalãs)

O Aznar do período 2000-2004 foi realmente o activador de muitos dos problemas que hoje temos em Espanha. Ele quis falar sem complexos de uma Espanha que muitos pensávamos esquecida, a Espanha UNA de Franco que lamentavelmente só existe e existiu por meio da força.

ETA é uma organização que pretende por meio de violência terrorista a Independência do País Basco. São mais de 40 anos de actividade e é imensa a dor causada. Existe uma possibilidade de conseguir uma saída pacífica do conflito e é isso o que Zapatero estava a tentar, da mesma maneira que Aznar tentou nos anos 98-99. A direita espanhola não permitiu, por motivos eleitoralistas, que Zapatero pudesse atingir qualquer sucesso. Deixou o governo sem possibilidade de ter espaço para negociar o fim de ETA não permitiu que foram feitas concessões como as que Aznar fez naqueles anos. O resultado é que o sector mais intransigente da ETA ficou com o poder da organização dado que as negociações não conseguiam nem aquilo que já quase foi conseguido no ano 99.

E o problema agora é que dois cidadãos de Equador morreram e que o PP está hoje mais contento do que há duas semanas. Esse é o maior problema que temos e não a suposta debilidade de Zapatero, que não é um político perfeito mas infinitamente mais digno do que estes dirigentes da extrema direita do PP espanhol

Javier Figueiredo (Badajoz)

*

Certamente já conhecerá, mas em complemento às observações sobre Zapatero, convem talvez recordar este passo célebre da História de Espanha. A leitura deste texto arrancou de um simpatizante franquista português (com muita idade) a exclamação "Estes espanhois quando são bons, são bons, venham lá de onde vierem!"

História de Espanha (3) - Don Miguel de Unamuno (1864-1936)

Entre as tragédias da Guerra Civil de Espanha encontramos inúmeros testemunhos de cobardia e de coragem. Vejamos este conhecido episódio protagonizado por D Miguel de Unamuno na sessão solene do dia da Hispanidade de 1936 na Universidade de Salamanca, de que era então reitor. Passo a citar Antony Beevor em La Guerra Civil Española:

“Mientras tanto, de los altavoces en las calles surgían las notas del himno de la Legión El novio de la muerte y en las emisoras de radio cada tarde sonaba un cornetín para anunciar el “parte” desde el cuartel del Generalísimo. En este ambiente cuartelero iba a tener lugar un notable acto de coraje moral, un incidente jaleado por el énfasis que se dio en él al valor puramente físico de la guerra. El 12 de octubre, aniversario del descubrimiento de América, “Día de la Raza”, tuvo lugar un acto ceremonial en el Paraninfo de la Universidad de Salamanca. La audiencia estaba integrada por notables del Movimiento, incluido un fuerte contingente de la Falange local. En el estrado tomaron asiento Carmen Polo, esposa de Franco, Pla y Deniel, obispo de Salamanca, el general Millán Astray, fundador del Tercio de Extranjeros (que llegó acompañado de sus legionarios), y Miguel de Unamuno, rector de la Universidad. Unamuno, irritado contra los gobernantes de la República, había apoyado al principio el “alzamiento” que debía “salvar la civilización occidental, la civilización cristiana que se ve amenazada”, pero no podía pasar por alto la matanza que se había llevado a cabo en la ciudad bajo las órdenes del comandante Doval, (…) ni los asesinatos de sus amigos Castro Prieto, alcalde de Salamanca, Salvador Vila, catedrático de árabe y hebreo de la Universidad de Granada, o García Lorca.
Los discursos iniciales corrieron a cargo de Vicente Beltrán de Heredia y de José María Pemán. Acto seguido el profesor Francisco Maldonado lanzó una tremenda diatriba contra los nacionalismos catalán y vasco, “cánceres de la nación” que había de curar el implacable bisturí del fascismo. Al fondo de la sala alguien lanzó el grito legionario “¡Viva la muerte!” y el general Millán Astray, que parecia el auténtico espectro de la guerra, manco, tuerto y cubierto de cicatrices, dio los “¡Vivas!” de rigor, mientras los falangistas saludaban a la romana hacia el retrato de Franco, que colgaba sobre el sitial de su esposa. El alboroto se desvaneció cuando Unamuno tomó la palabra:

Estáis esperando mis palabras. Me conocéis bien y sabéis que soy incapaz de permanecer en silencio. A veces, quedarse callado equivale a mentir. Porque el silencio puede ser interpretado como aquiescencia. Quiero hacer algunos comentarios al discurso, por llamarlo de algún modo, del profesor Maldonado. Dejaré de lado la ofensa personal que supone su repentina explosión contra vascos y catalanes. Yo mismo, como sabéis, nací en Bilbao. El obispo, lo quiera o no lo quiera, es catalán nacido en Barcelona.

Pla y Deniel se removió a disgusto por la alusión de Unamuno a su lugar de origen, que era casi en si mismo una implicación de deslealtad a la cruzada nacional.
Entre el silencio, Unamuno prosiguió:

Pero ahora acabo de oír el necrófilo e insensato grito: “¡Viva la muerte!”. Y yo, que he pasado mi vida componiendo paradojas que excitaban la ira de algunos que no las comprendían, he de deciros, como experto en la materia, que esta ridícula paradoja me parece repelente. El general Millán Astral es un inválido. No es preciso que digamos esto con un tono más bajo. Es un inválido de guerra. También lo fue Cervantes. Pero, desgraciadamente, en España hay actualmente demasiados mutilados. Y, si Dios no nos ayuda, pronto habrá muchísimos más. Me atormenta pensar que el general Millán Astral pudiera dictar las normas de la psicología de la masa. Un mutilado que carezca de la grandeza espiritual de Cervantes, es de esperar que encuentre un terrible alivio viendo cómo se multiplican los mutilados a su alrededor.

Llegado Unamuno a este punto, Millán Astray ya no pudo contener su ira por más tiempo. “¡Muera la inteligência! ¡Viva la muerte!” gritó a pleno pulmón. Falangistas y militares echaron mano a sus pistolas y hasta el escolta del general apuntó su subfusil a la cabeza de Unamuno, lo que no impidió que éste terminara su intervención en tono desafiante:

Este es el templo de la inteligencia. Y yo soy su sumo sacerdote. Estáis profanando su sagrado recinto. Venceréis, porque tenéis sobrada fuerza bruta. Pero no convenceréis. Para convencer hay que persuadir. Y para persuadir necesitaríais algo que os falta: razón y derecho en la lucha. Me parece inútil el pediros que penséis en España.

Hizo una pausa y dejando caer, sin fuerza, los brazos, concluyó en tono resignado:

He dicho”.

Se dice que la presencia de Carmen Polo le libró de ser asesinado allí mismo y que cuando Franco se enteró de lo que había ocurrido lamentó que no hubiese sido así. Seguramente los nacionales no asesinaron a Unamuno por la fama internacional del filósofo y por la reacción que había causado ya en el exterior el asesinato de García Lorca. Pero Unamuno, destituido como rector y confinado en su domicilio, murió el día de fin de año consternado y tachado de “rojo” y traidor – aunque su funeral fuera manipulado por los falangistas – por aquellos a quienes él había creído amigos.

(Pág 149 – 152)

(Miguel G. Cardoso)

*

Concordo com muito do que diz, mas permita-me divergir um pouco. Parece-me que o ponto em que os nacionalismos espanhóis foram picados não foi com Zapatero no poder, mas antes quando, na segunda maioria de Aznar (a primeira absoluta), o Governo do PP, de repente livre da necessidade de negociar com os moderados bascos e catalães, começou uma política de confronto minucioso com os nacionalismos espanhóis não castelhanos (em pequenas coisas como as matrículas, por exemplo). Aí, ao tentar reafirmar o centralismo espanhol após anos de cada vez maior autonomia, Aznar acordou os tais demónios. Seja como for, tenho para mim que esses "demónios" nunca estiveram realmente adormecidos e que a solução para Espanha não passa por mais centralismo. Aliás, na libertação das energias autonomistas parece-me estar, em parte, a explicação do sucesso de Espanha (e incluo nessa libertação as tensões imensas entre regiões, que resultam num país muito mais complexo e dinâmico). Nada disto impede que a condução do "processo de paz" tenha sido um desastre. As minhas palavras referem-se mais, aliás, à Catalunha, e não tanto ao País Basco (são dois problemas muito distintos).

(Marco Neves )

(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]