ABRUPTO

29.1.07


APRENDER COM CAMILO CASTELO BRANCO:
"HÁ-DE CHORAR AINDA QUE LHE CUSTE"

"A todos os que lerem
É uma historia que faz arrepiar os cabelos.
Há aqui bacamartes e pistolas, lágrimas e sangue, gemidos e berros, anjos e demónios.
É um arsenal, uma sarrabulhada, e um dia de juízo! Isto sim que é romance!
Não é romance; é um soalheiro, mas trágico, mas horrível, soalheiro em que o sol esconde a cara,
(...)

Há aí almas de pedra, corações de zinco, olhos de vidro, peitos de asfalto?
Que venham para cá.
Aqui há cebola para todos os olhos;
Broca para todas as almas;
Cadinhos de fundição metalúrgica para todos os peitos.
Não se resiste a isto. Há-de chorar toda a gente, ou eu vou contar aos peixes, como o padre Vieira, este miserando conto.
(...)
Tenha paciência; há-de chorar ainda que lhe custe."

Camilo dirige-se assim aos seus leitores prevenindo-os que O Que Fazem Mulheres, um "romance filosófico", tinha "cebola para todos os olhos". Ou choravam, ou ele ia pregar aos peixes. Excelente leitura para estes tempos em que o pathos escorre das paredes, blogues e ecrãs (a mesma coisa aliás) e o mundo se torna pegajoso de tantos sentimentos à solta e tanto amor a pingar por todo o lado. Bem sei que é o "espectáculo", - Camilo também sabia, chamava-o "soalheiro" -, o pano de fundo da superficialidade moderna e dos Pequenos Homens (e Mulheres) de quem Nietzsche não gostava. O que se há-de fazer senão fortalecer "almas de pedra, corações de zinco, olhos de vidro, peitos de asfalto" e sorrir?

(E ler Camilo que tem vindo a ser publicado numa excelente edição da Caixotim, já com doze livros cá fora.)

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