ABRUPTO

7.12.06


COISAS DA SÁBADO: MEMÓRIA DE ALFREDO PEREIRA GOMES

Morreu a semana passada Alfredo Pereira Gomes um dos importantes matemáticos portugueses do século XX, perante o silêncio e o esquecimento. Parte desse silêncio vinha da modéstia do próprio, que aceitou muitas vezes desaparecer de uma cena onde era grande, outra parte vem da nossa proverbial ignorância acerca dos portugueses cujo valor não passa pela exposição dos media. Tive o privilégio, para usar esta expressão gasta mas verdadeira, de com ele conviver nos seus últimos anos, conversando sobre o seu mundo muito especial, o mundo de uma geração maior de matemáticos que foram também homens da oposição a Salazar e por isso fizeram carreira fora de Portugal.

Alfredo Pereira Gomes fez mesmo um esforço para me explicar o seu ramo das matemáticas, mas, ruim entendedor, fiquei-me com as suas histórias povoadas de gente como seus irmãos e irmãs (o mais conhecido foi Soeiro), e os cientistas que se ligaram ao PCP desde os anos trinta, com as suas vidas académicas perturbadas pela repressão e obrigados a desenvolver os seus projectos em França, nos EUA e no Brasil. Essas histórias não eram alheias à demarcação de um território próprio nas matemáticas, e incluíam apreciações muitas vezes mordazes e irónicas, mas eram vivas, traziam gente viva consigo para a réstia de memória que eu lhes podia dar escrevendo sobre eles.
Espero, tenho a certeza, que uma matemática muito especial o espera agora. Se ele fosse crente não teria muitas dúvidas que se morresse há uns anos, teria Fermat à porta do Paraíso a explicar-lhe o seu último teorema. Agora esse problema parece resolvido, mas haverá certamente outros que Alfredo Pereira Gomes defrontará com a harmonia muito especial do seu trabalho e do seu gosto.

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© José Pacheco Pereira
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