ABRUPTO

4.9.06


TRABALHO DE LOUCOS


Há coisas que ninguém com bom senso faz, e uma delas é escrever uma enciclopédia ou um dicionário. É, pela sua natureza, um trabalho colectivo e mesmo o célebre Dr. Johnson tinha uns "negros" para o ajudar. Eu, que estou a escrever um dicionário que na prática é uma enciclopédia, sei bem até que ponto é do domínio da loucura meter-me nisto. Acho que não vai acabar bem, as "entradas" ganham vida própria e um dia assaltam-me à esquina de qualquer estante. Nenhum software comercial para mortais comuns verdadeiramente suporta o tamanho, a conjugação entre dados formatados e texto livre e o hardware, de centenas de gigabites (não, ainda está longe dos terabites, mas lá chegará...) que sai da caixa electrónica e passa para livros e fichas colocados por ordem alfabética (das entradas) , serpenteia das estantes para caixas e livros e pilhas de artigos e jornais. Distantes patronos para quem olho com reverência e humildade? Lineu, Humboldt, o dr. Johnson, os enciclopedistas...

Há pelo menos um dilema que não tenho: não tenho que escolher nada, é suposto que lá esteja tudo, nomes, organizações, jornais, eventos, factos e factóides, palavras, jargão, cruzando-se entre si numa rede quase infinita. A rede dá-me quase tanto trabalho como as entradas. Cada uma faz o milagre da multiplicação dos pães e gera muitas outras, logo tudo cresce exponencialmente. É biológico, não é químico, nem mecânico. Quanto mais se sabe, mais falta saber, como naquelas histórias borgeanas sobre o mapa perfeito, que tem o tamanho do território a representar ou o olhar dos fractais para a linha da costa, do conforto da fotografia aérea, com a costa talhada a rigor, para passar para a terra, rocha a rocha, e depois duna a duna, areia a areia...



(Pequena parte da letra M, entre Maio 68, Marcuse e Música.)

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© José Pacheco Pereira
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