ABRUPTO

2.6.06


UMA OPORTUNIDADE PERDIDA: DISCUTIR TIMOR A SÉRIO



No artigo da Sábado, que seguiu segunda-feira à noite para a revista (que só se publica na quinta-feira), fazia as seguintes perguntas:
"Se criticamos os australianos de ingerência indevida, por dizerem que não há governo em Timor-Leste, com que lado alinha Portugal no conflito institucional timorense? A RTP e muita da comunicação social de “causas”, incluindo Marcelo Rebelo de Sousa, alinham por Xanana contra o Primeiro-ministro, sem se saber muito bem porquê, mas a nossa política externa também “alinha”? Se os australianos se estão a ingerir nas questões de Timor-Leste, o que significa que estão a por em causa a soberania do país, quem manda em última instância nas ruas, o governo de Timor ou a Austrália? E se mandar a Austrália, e manda quem pode e tem a força, mandam também os comandos australianos na GNR? Se os australianos entenderem que a rua X está interdita, a GNR tem que negociar ou pedir licença para lá passar? Qual é a cadeia de comando em Dili?
Estas e mais mil e uma perguntas deviam estar a ser feitas e a ter respostas claras. Mas nem se pergunta, nem se responde."
Tentei discutir esta mesma questão na Quadratura do Círculo e a resposta foi que estava tudo já combinado e não havia qualquer problema com a cadeia de comando em Dili. Procurei na comunicação social alguma reflexão sobre esta questão, tão evidente era. Nada, até há vinte e quatro horas, quando subitamente se começou a perceber nas habituais declarações agrestes do Ministro dos Negócios Estrangeiros, que, ou havia precipitação, ou negligência (nossa) ou dolo (deles). Dolo de quem? De Xanana, do Governo legítimo de Timor, dos australianos?

Há explicações muito claras que têm que ser dadas, e não vejo a oposição e os parlamentares a fazerem aquilo que é a sua verdadeira função: vigiar o governo, controlar os seus actos, perguntar. Timor não pode continuar a ser um tabu "consensual". As decisões sobre Timor ou são puramente humanitárias, - ir lá buscar ou proteger os portugueses, já que para salvar os timorenses não temos capacidade, só os australianos -, ou são actos da nossa política externa, e como tal devem ser explicados. Ora o que diz o Ministro dos Negócios Estrangeiros pode ter duas interpretações contraditórias: ou é excessivo ou é bem pouco. Tudo está por explicar: o que é que se está a passar em Timor, e qual o nosso papel?

*
Ouvi na televisão o ministro dos Negócios Estrangeiros, Diogo Freitas do Amaral, afirmar, relativamente aos militares da GNR que se dirigem para Timor, que «Portugal tem mais de oito séculos e meio de independência nacional e não aceita que forças militares suas sejam comandadas por militares estrangeiros». Permito-me corrijo-lo. De facto, já por diversas vezes no passado Portugal aceitou «efectuar importantes transferências de soberania. A primeira foi em 1949, com Oliveira Salazar, quando Portugal foi membro fundador da NATO, aceitando que, em caso de guerra no teatro europeu, as suas tropas fossem comandadas por um Estado-Maior internacional, chefiado por um general americano (os nacionalistas não protestaram então». Talvez o Ministro dos Negócios Estrangeiros devesse informar-se junto do autor do livro do qual extraí esta passagem. Chama-se «Um voto a favor de Maastricht: Razões de uma atitude», escrito por um certo Diogo Freitas do Amaral.

(José Carlos Santos)

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