ABRUPTO

7.6.06


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: OS CLÁSSICOS EM RISCO

Apreciei muito o que escreveu na última revista Sábado sobre a necessidade de dar atenção aos clássicos greco-latinos. Por isso tomo a liberdade de lhe enviar o endereço electrónico de uma petição que os Departamentos de Estudos Clássicos das Universidades de Coimbra e Lisboa puseram há pouco mais de uma semana na internet. O que pretendemos é reunir um número significativo de assinaturas que permitam abrir a discussão pública sobre o espaço residual que vem sendo atribuído às disciplinas das Humanidades nos curricula do ensino secundário, com especial gravidade no que respeita ao Latim e ao Grego, que praticamente desapareceram das escolas em todo o país. Acabada a geração que tanto se tem empenhado em divulgar os clássicos, como os que referiu no seu artigo, e outros, como as Confissões de Santo Agostinho, Propércio, a Eneida de Vergílio, o Satíricon de Petrónio, as comédias de Plauto..., ninguém mais ficará capaz de traduzir esses textos, nem de ensinar línguas clássicas e, mesmo na área da História de Portugal, de trabalhar todo o acervo de documentação em língua latina que vem, como sabe, até bem perto de nós... Serão, pois, os investigadores estrangeiros a virem trabalhar esses textos.

(Maria Cristina de Sousa Pimentel, Prof.ª Catedrática da Faculdade de Letras de Lisboa (Departamento de Estudos Clássicos)

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Segundo me relatou uma professora da universidade, o ministério da educação prepara-se para fechar o curso de Línguas e Literaturas Clássicas em Lisboa e em Coimbra, as duas únicas Universidades que ainda leccionam este curso. O critério usado é de o curso ter menos de vinte alunos por ano. O que é, tristemente, um facto.

No entanto, penso que é importante não esquecer que sem este curso, não haverá daqui por uns anos, em Portugal, quem possa traduzir qualquer obra de Latim ou grego clássico. Pois, quando as poucas pessoas altamente qualificadas que hoje em dia fazem esse trabalho deixarem de o fazer, não haverá quem o possa fazer.

Terminar a ligação cultural directa com as matrizes do pensamento cultural europeu é um erro crasso. Portugal ficará a perder para Países como a Geórgia, a Turquia, a Espanha, a Itália, a Croácia, a Grécia, o Chipre, a Polónia etc.. e ficará ao nível dos países do terceiro mundo, onde as dificuldades económicas não permitem a evolução cultural.

Sei que Portugal atravessa dificuldades económicas, mas antes de terminarem com o curso de línguas e Literaturas Clássicas, podiam ir buscar dinheiro a muitos outros sítios?

Sem Línguas e Literaturas Clássicas, não haverá pessoas como Maria Helena da Rocha Pereira para nos ensinarem tanto sobre a cultura helénica, nem tradutores como Frederico Lourenço que levam para o Português as obras de Homero, Sófocles, Eurípides e muitos outros.
Não troco a minha cultura por dinheiro nenhum, e penso que há coisas que não têm preço, e o ensino do Latim, a língua mãe do Português e do Grego antigo é essencial num país com ambições não meramente económicas mas também culturais.

Está em curso uma petição on-line que tenta sensibilizar as pessoas para este problema.

Penso que todos os que trabalham com a língua Portuguesa e são minimamente sensíveis à ?Cultura? entenderão e subscreverão a petição.
Além da petição quaisquer formas de protesto sobre esta medida são bem-vindas, e sabendo a força dos meios de comunicação social, se ninguém souber o que se passa sobre este assunto, o encerramento do curso poderá mesmo acontecer.

(Manuel Fialho Silva, estudante do curso de Línguas e Literaturas Clássicas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. )

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Tomei conhecimento via Abrupto da petição online em favor das línguas clássicas em Portugal. (Já agora: «em favor»? Não deveria ser «a favor»?) O assunto interessa-me por diversas razões, uma das quais ser o facto de lastimar nunca ter aprendido latim. Mas não posso assiná-la e passo a explicar porquê. Na argumentação a favor da petição, os seus autores citam (favoravelmente) a expressão de Manuel Damásio «a matemática e as ciências não formam cidadãos». E é aqui que reside o problema. É que só vejo duas maneiras de interpretar esta expressão:

- ou significa que a Matemática e as Ciências (porque é que na citação original estará escrito com minúscula?) não contribuem para a formação dos cidadãos;

- ou significa que uma formação em Matemática e em Ciências não constitui, só por si, uma formação de cidadãos.

Ora eu sou totalmente contra a primeira interpretação. Quanto à segunda, é uma completa trivialidade. Não, uma formação em Matemática e em Ciências não constitui, só por si, uma formação de cidadãos. Uma formação em clássicos também não.

Bem sei que assinar uma petição não significa necessariamente que se está de acordo com todos os pontos mas, neste caso, a barreira é demasiado elevada para que eu a consiga tranpor.

(José Carlos Santos)

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Relativamente à petição para o renascimento do latim e do grego, lembro-me de ter lido, já há alguns anos, na revista Esprit, um longo artigo justificando a necessidade de os reanimar em virtude de haver ainda um largo acervo de textos clássicos greco-latinos por traduzir. Deduzo perante a petição que, ou se esgotaram as traduções, ou, se não é o caso, os outros países que as façam. Se estamos tão atrasados em tantas áreas, entre nós, parece não constituir vergonha banir o latim e o grego do ensino, e ficar à espera dos textos já vertidos. Enfim, somos o que somos, e temos o país que temos. Como diziam os liberais vintistas, não temos emenda.

João Boaventura

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