Ele há mau ganhar, mas duvido que se encontrem muitos exemplos significativos de mau ganhar até agora. Mas mau perder abunda por todo o lado, sendo até um dos traços distintivos destas eleições presidenciais. A história da "vitória tangencial" é um exemplo. Cavaco ganhou à primeira volta por uma maioria absoluta face a cinco candidatos que fizeram campanha contra ele, e à distância de 30% do segundo classificado, ganhou em todos os distritos do país com excepção de Beja, e ganhou "à tangente"?
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E depois há frases inqualificáveis como as ditas por Vital Moreira no Causa Nossa:
"O problema com Cavaco Silva não é só ele ser o primeiro presidente oriundo da direita política, nem o inigma sobre a sua prática presidencial. É ele suceder a quem sucede: 10 anos de um presidente maior do que o País (Mário Soares); 10 anos de um dos presidentes mais cultos e "aristocratas"(no verdadeiro sentido da noção) que já tivemos (Jorge Sampaio). Ter agora um presidente que não ultrapassa os limites de uma cultura economista e tecnocrática é uma enorme sensação de despromoção..." (sublinhado meu)
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Para uma antologia do mau perder:
"Pedro Santana Lopes, ex-líder do PSD, afirmou hoje que Cavaco Silva só ganhou as eleições presidenciais à primeira volta devido à ausência de um outro candidato à direita. "Se houvesse outro candidato à direita, haveria uma segunda volta", referiu Santana Lopes em declarações à SIC-Notícias." (Portugal Diário)
Como é evidente, "só" haver um candidato "à direita", nada tem a ver com o mérito de Cavaco Silva, mas deve ter sido benemerência dos putativos candidatos.
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No sítio do Diário de Notícias (diferente no seu arranjo gráfico do jornal em papel), a vitória de Cavaco Silva é um acontecimento menor ( o terceiro sem relevo, depois de uma história de penhoras e bancos e de outra sobre carros chineses), de tal maneira que pensei que o jornal lá colocado era o de ontem. É um absurdo comunicacional, já para não dizer outra coisa.
Actualização: a ordem das notícias foi mudada durante o dia, depois desta nota divulgada, e passou Cavaco a primeiro.
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A interrupção do discurso de Alegre por Sócrates gerou, na pequena multidão que estava dentro da SIC, imediatas e sonoras manifestações de protesto, que ultrapassaram partidos e amizades políticas. Eu protestei alto e bom som na minha mesa, Helena Roseta na dela e, atrás de mim, no grupo a que a SIC chamou da "sociedade civil" ouviam-se também protestos. Os jornalistas que conduziam a emissão ficaram também perplexos e incomodados pela evidente e grosseira manobra de ocultação de Alegre, mas não era fácil não dar a prioridade ao discurso de Sócrates,no tempo real em que estas emissões se fazem. Sócrates é o Primeiro-Ministro e um dos responsáveis pelo desastre do PS e forçou ser ouvido. Justiça seja feita neste caso à SIC que se apercebeu de imediato que tinha que encontrar uma forma de reparar Alegre, que denunciou de imediato a malfeitoria e anunciou a repetição da declaração de Alegre. Não sei o que fizeram as outras televisões, mas tenho curiosidade em saber.
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Mal anunciei que iria fazer o Abrupto directo da mesa da SIC e apelava à contribuição dos leitores, um "amador" qualquer enviou para o meu endereço de e-mail, uma série de ficheiros gigantescos para o bloquear, pelo que algum correio deve ter sido perdido.
Segundo o Google Analytics o Abrupto teve mais de 16000 "pageviews" ontem.
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Provavelmente não se apercebeu (já que estava em directo na SIC) mas na TVI, M. Sousa Tavares e outros, alegaram que, tendo Cavaco Silva sido eleito presidente com o menor percentual e número de votos da história, o seu espaço de intervenção estava reduzido. Ora, sem sequer insistir no ponto óbvio de a vitória se ter verificado à primeira volta - o que só por si a torna necessariamente mais forte do que qualquer outra que se tenha registado à segunda -, convém também lembrar que Cavaco teve mais votos do que Sócrates nas últimas legislativas (2,8 milhões vs 2,6 milhões). Os números falam por si...
Francisco Barbosa
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E ao menos sabe comer à mesa?
É impossível ler hoje o livro «Angústia para o jantar», de Luís de Sttau Monteiro, sem recordar as inúmeras observações de Mário Soares em desprimor de Cavaco Silva - de tal forma elas parecem inspiradas neste romance em que um outro António é humilhado da mesma forma torpe.Quando, nos anos 60, o li pela primeira vez, a personagem que faz o papel de snob-de-serviço provocou-me uma náusea que agora (no decorrer de uma segunda leitura) ressuscitou - e em duplicado, vá lá perceber-se porquê!
C. Medina Ribeiro
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Quando Cavaco Silva saiu de casa, ouviram-se duas perguntas colocadas por um jornalista: «O que lhe vai pela cabeça?» e «O que foi que lhe disse o dr. Soares?» Cavaco Silva respondeu à segunda; obviamente, a resposta consistiu em dizer que não revelaria tal informação. A minha pergunta é: o que vai pela cabeça do jornalista ao perguntar o que foi que disse Mário Soares? Por acaso pensou que Cavaco Silva lho diria?
(José Carlos Santos)
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Tanta "conversa" (em 96, 97?) por causa do voto dos emigrantes para a Presidência da República para, afinal, a taxa de abstenção dos portugueses residentes no estrangeiro ultrapassar os 90%!
(M.F.Åhman, Suécia)
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Embora seja prematuro estar a estabelecer cenários a eleição de Cavaco representa, de facto, uma rotura no que tem sido a centralidade política em Portugal.
O discurso oficial do PS e do PCP no passado, quando socialistas foram eleitos presidentes, foi o de logo à partida lhes atribuir um estatuto de independência, isenção e idoneidade que esquecia as suas origens políticas e lhes atribuía uma superioridade moral, de rigor e de dimensão ética.
Será curioso ver como irão reagir se Cavaco for presidente. O que, naturalmente, espero venha a acontecer.
(António Taveira)
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Uma ilação interessante destas eleições presidenciais é o facto dos dois candidatos mais votados serem aqueles que mais fraca performance televisiva têm. Claro que performance televisiva é entendida, neste contexto, como a capacidade de gerar o sound-byte, de ter a pequena frase assassina ou em sentido mais lato de “ter conversa”.
Cada vez mais os portugueses avaliam, sobretudo, currículos e valores que atribuem a cada candidato ou partido e esses encontram-se, de um modo geral, bastante sedimentados na avaliação do eleitorado. Neste sentido a campanha tradicional perdeu muita importância.
(Miguel Alçada Baptista)
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1) O vencedor ganhou e é acusado de ter preparado rigorosa e profissionalmente a candidatura. Queremos desenvolver o país, profissionalizar as actividades, acabar com o nacional-desenrascanço. Depois acusamos quem pratica esse profissionalismo de ter “ganho porque preparou tudo com antecedência e rigorosamente”. Em que ficamos? Relembremos que Cavaco ganhou as 3 legislativas em que esteve à frente do PSD, 2 delas com maioria. Perdeu umas presidênciais à 1ª volta e ganhou outras à 1ª volta sem ter que dar sais de fruto a ninguém.
2) Manuel Alegre valeu a pena. Teve valor acrescentado. Mostrou que o nacional- desenrascanço ainda vai funcionando, que ainda somos um país de poetas e que as pessoas gostam das “vitimas”. E mostrou também que é possível vencer os aparelhos partidários (de onde Alegre saiu) apesar das muitas fidelidades caninas às prebendas que os partidos no poder distribuem.
3) O grande derrotado, sem honra nem glória. Fez uma campanha ressabiado com Anibal e Alegre, mal educada, contraditória, sem fair-play, mostrou apenas um sentido de posse pelo Palácio Cor-de-Rosa, tipo a criança e o seu brinquedo preferido. E mais, mostrou que o animal político já não é o que era, qual Amália nos seus últimos anos. Desses tempos sem glória da fadista apenas ficou para a história o “obrigado, obrigado”. E os eleitores mostraram saber distinguir entre gratidão e capacidade para a função em causa no actual momento do país. Se a interrupção de Socrates a Alegre foi propositada, mostra arrogancia e mau perder, se foi um erro mostra falta de profissionalismo de quem quer modernizar o país. De facto o rigor e profissionalismo de Cavaco vão ser um valor acrescentado para o país. Relembremos que em 4 legislativas e 1 constituinte Mário Soares só conseguiu 3 vitórias e todas sem maioria absoluta. E nas presidênciais precisou de dar muitos sais de fruto aos comunistas para bater Freitas na 2ª volta.
4) O resto foram os figurantes do costume entre a esquerda Caviar-Champagne e a esquerda de rosto popular. A leste nada de novo.