ABRUPTO

26.5.05


A CONSTITUIÇÃO QUE NUNCA TEM NADA A VER COM AS RAZÕES PELAS QUAIS SE LHE DIZ “NÃO”

São estas pequenas coisas, que passam desapercebidas, que manipulam a opinião pública: no noticiário da 2, a pretexto das manifestações dos agricultores e vinhateiros franceses que apelavam ao “não”, a jornalista-locutora diz que o “não” cresce em França “por coisas que nada têm a ver com a Constituição Europeia”, um juízo de valor não uma notícia. “Por coisas que nada têm a ver com a Constituição Europeia”? Esta agora! Então a Constituição não tem a ver com tudo? Então o governo da Europa, as suas políticas e os seus efeitos, nada têm a ver com o texto constitucional?

A descrição da Constituição pelos seus defensores oscila, ao sabor das circunstâncias, entre um angelismo absoluto – a Constituição nada tem a ver com a UE tal como ela é de facto, nem com as políticas europeias – ou como um upgrade político salvífico da UE que dará uma nova dimensão a todas as políticas europeias. Não, as “coisas que nada têm a ver com a Constituição Europeia”, não são mesmo nenhumas, todas têm a ver, por muito que isso custe aos que queriam que os europeus votassem no texto de um documento puramente angélico, uma nuvem benfazeja, pairando no mundo jurídico das regras abstractas, escritas pelos Melhores em nome do Bem.

(Colocado igualmente no SÍTIO DO NÃO.)

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© José Pacheco Pereira
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