ABRUPTO

1.4.05


O ENXOFRE É BOM PARA AS RÃS?

No Inferno há muito enxofre, mas que me lembre não há rãs. Há umas nos quadros de Bosch, mas ele meteu lá tudo e por isso não conta. No interior da cratera, das paredes e do chão, sai fumo, fumo de enxofre a julgar pelo cheiro e pela cor amarela e avermelhada da terra à volta. Mas, mesmo lá no meio, a chuva há muito tempo fez uma lagoa, cheia de ervas e vida. A julgar pelo festival de som e pelo intenso movimento à superfície, as rãs não se dão mal no Inferno.

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"Envio-lhe uma fotografia que tirei no Japão, mais concretamente num dos vulcões do Parque Nacional de Shikotsu-Toya, na ilha de Hokkaido. Pude por lá respirar muito enxofre."


(Pedro Matos Soares)


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Fernando Pessoa sobre as rãs, lembrado por RM:

Todas as cousas que há neste mundo
Têm uma história,
Excepto estas rãs que coaxam no fundo
Da minha memória.
Qualquer lugar neste mundo tem
Um onde estar,
Salvo este charco de onde me vem
Esse coaxar.

Ergue-se em mim uma lua falsa
Sobre juncais,
E o charco emerge, que o luar realça
Menos e mais.

Onde, em que vida, de que maneira
Fui o que lembro
Por este coaxar das rãs na esteira
Do que deslembro?

Nada. Um silêncio entre juncos dorme.
Coaxam ao fim
De uma alma antiga que tenho enorme
As rãs sem mim

(url)

© José Pacheco Pereira
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