ABRUPTO

28.2.05


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: CONTA, PESO E MEDIDA

Conta, Peso e Medida: a ordem matemática e a descrição física do mundo é uma exposição de obras antigas (dos séculos XV e XVI) sobre temas de ciências físico-matemáticas e disciplinas afins que inaugura a 2 de Dezembro de 2004, na Biblioteca Nacional, em Lisboa, e estará patente ao público até final de Fevereiro de 2005. Com a realização desta exposição a Biblioteca Nacional associa-se às comemorações de 2005, Ano Internacional da Física. “

Fui ver esta exposição à Biblioteca Nacional. Sábado, fim da manhã. A porta principal da BN está toda fechada com um papel branco a indicar a entrada por uma das portinholas laterais. Decifrada primeira parte do labirinto, entramos. À frente vários obstáculos (mesas, vasos e depois umas barreiras “tipo metropolitano”), ao fundo à esquerda um balcão onde, muito a custo e depois de inúmeras perguntas para percebermos como é que funciona, se é ali, se paga ou não, como é que se entra (todas respondidas com enigmáticos monossílabos), nos é aberta a passagem. Avançamos felizes, chamam-me para me dizerem que tenho que entrar num compartimento ao lado e deixar a minha mala num cacifo onde tenho que introduzir uma moeda de 1 Euro - no fim devolvemos - para fechar o cacifo e guardar a chave.

Concluída a operação, partimos à procura da exposição. Novo chamamento: - Tem que ir pelo elevador que é aqui. O espaço é claustrofóbico e pouco convidativo. As crianças têm que se esticar para ver os livros não conseguem ver e … a livraria, aos Sábados está fechada, por isso não pudemos comprar o catálogo da exposição. Aproveitamos para ver a secção de periódicos mas “os meninos não podem entrar”.
- Nem mesmo se não fizermos barulho e não mexermos em nada? Nope! (A outra sala de periódicos, a de acesso livre… está fechada aos Sábados.)

Dizer mal é fácil, bem sei. E é melhor haver esta exposição do que não haver nenhuma. É melhor haver Biblioteca Nacional do que não haver. E a exposição é obviamente interessante, embora eu não conheça ninguém que lá tenha ido. (Ou, se calhar foram mas ainda andam perdidos pelos corredores vazios e bafientos à procura dela.)

Havia um grupo a visitar a exposição guiado por um responsável, penso que da BN. No fim discutiu-se a nossa falta de interesse pelas “artes” de contar, pesar e medir, pelas ciências em geral. Que exposições como esta, para além do gosto pelos livros, podem ajudar a ultrapassar. Isto depois de ultrapassarmos teimosamente todos os obstáculos que a própria Biblioteca Nacional coloca ao nosso interesse pela exposição. É estranho … tanto trabalho para a organizar e depois parece que não querem que lá vamos.
Como sou teimosa, hoje vou lá comprar o catálogo da exposição. (Ah, e a exposição foi prolongada até 5 de Março.)

(R.M.)


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Congratulando-nos com o relevo dado à exposição Conta Peso e Medida, que tem estado patente na Biblioteca Nacional, e ao respectivo catálogo, permitimo-nos fazer alguns esclarecimentos. Assim:

1 – O guia das várias visitas organizadas que se realizaram foi o Prof. Henrique Leitão, da Faculdade de Ciências de Lisboa, que foi o coordenador científico da exposição e do catálogo.

2 – As crianças não podem entrar na sala de leitura de periódicos, ou em qualquer outra das salas de leitura da Biblioteca, pela simples razão de que tal não é compatível com o interesse dos investigadores que lá se encontram a trabalhar.

3 – O espaço para exposições, não sendo «claustrofóbico», está pensado especificamente para mostras de livros e documentos, muitas vezes raros, o que implica obediência a normas universais em matéria de preservação.

4 – À semelhança do que acontece em bibliotecas congéneres de todo o mundo e em instituições que têm à sua guarda bens patrimoniais, o acesso à Biblioteca Nacional é expressamente condicionado.

5 – A entrada na Biblioteca faz-se por um dos módulos da porta principal, a fim de se resguardar o átrio de entrada, sobretudo durante o Inverno, e não por uma qualquer «portinhola» lateral, que, de resto, não existe, como qualquer visitante poderá confirmar.

Ressalvados estes aspectos, que fazem, afinal, a diferença entre uma biblioteca nacional e uma biblioteca pública ou uma ludoteca, todas as críticas são bem vindas e todos os visitantes, por maioria de razão, bem acolhidos.
(Biblioteca Nacional - Área de Relações Públicas)

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Embora trabalhe no âmbito dos museus percebo perfeitamente o ponto de vista do senhor R.M. e surpreende-me deveras a resposta da Área de Relações Públicas da Biblioteca Nacional. Seguramente não estão a desempenhar correctamente a Vossa tarefa porque senão:
Teriam a entrada devidamente sinalizada;
Teriam um balcão/bilheteira específico;
Teriam uma sala de exposições temporárias junto à entrada permitindo que o público da exposição não necessitasse de subir os vários pisos da biblioteca (ou circular por outras áreas dela) para chegar à exposição (julgo que a sala da Área de Relações Públicas poderia ser uma excelente escolha, não teve já essa fungão?);
Teriam um local de venda de catálogos integrado na zona da exposição.
Como nada disso existe, fica a sensação de que a Biblioteca Nacional andou a gastar dinheiro dos contribuintes para organizar uma exposição que só serve para distrair os investigadores residentes, nos períodos em que esperam pelos livros mas, nesse caso, não seria mais simples prescindirem de publicitar a iniciativa? De qualquer modo, por favor, não tratem de forma sobranceira quem ainda não tinha tido oportunidade de ir à Vossa instituição, afinal não é ela de nós todos?
(P.B.)

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Neste Sábado 26/Fev. à tarde, ao sair da exposição referida considerei enviar-lhe umas notas sobre a experiência. A motivação para a escrita seria unicamente o conteúdo em si da exposição e não as contingências do acesso a ela. O impulso para a nota a enviar provinha nessa tarde da emoção vivida na exposição, sobre a qual, com pena, não tinha visto qualquer referência até essa data. Vi que a exposição foi referida, embora o foco de atenção se tenha desviado para um aspecto, importante, mas que no meu caso foi suplantado pelo prazer da visita.

Para quem cresceu a ler divulgação científica (obrigado a Guilherme Valente da Gradiva), a exposição emociona. Mas não só. Ela lança-nos mais informações pela simples observação dos livros. A informação surge nas formas; nas datas de edição; nos detalhes e no esforço das ilustrações técnicas; nas línguas das escritas (Grego, Latim, Castelhano, Italiano - antes de Sábado julgava, erradamente, que Galileu teria sido muito revolucionário na escolha da língua; vi que uns 50 anos antes do "Saggiatore" e dos "Diálogos" já vários faziam a divulgação científica na língua das massas), nas formas das edições (impressionaram-me os pequenos volumes para estudantes universitários quinhentistas). Em suma, a beleza e a utilidade unidas, geradas pelo interesse de alguns e pela necessidade prática de muitos (destaca a construção civil, militar, e a navegação).

O próprio destaque dado na organização do espaço faz crer que o mais apelativo sejam os vários exemplares com as primeiras edições dos livros (leia-se capítulos, hoje) do "Elementos" de Euclides (abertos em figuras do teorema de Pitágoras, nessa altura já a caminho dos 2 milénios) ou o "Almagesto" de Ptolomeu, ou, uma 2ª edição do "De Revolutionibus" de Copérnico, aberto na figura heliocêntrica. Porém, para mim, o que mais funciona é o conjunto e as surpresas. Quando me dirigi para lá pensava que a exposição abarcaria o séc. XVII, ou seja esperava ver alguns "Galileus" ou um "Principia". A exposição foca contudo o séc. XV e, majoritária e necessariamente, os quinhentistas. O que para mim ficou foi a sensação de como os autores dos livros sentiam a necessidade pulsão de os fazer publicar. Na medida da época é certo, mas sente-se a urgência e o desejo da divulgação, na sucessão de datas de publicação, como se a rajada estivesse contida há muito. Havia quase tudo por fazer. Como sempre. Foi bom ver as primeiras edições impressas dum funesto Boécio (muito lembrado por si), de Arquimedes (também assassinado, mas com morte menos brutal - apenas uma espada romana) mas também de Vitelio ou Tartaglia, nomes menos famosos que têm o seu lugar na memória de quem gosta da chamada cultura científica.

O que a leitora relatou é poder-se-ia imaginar fácil de ocorrer, bastando para tal que o segurança do momento fosse do tal tipo monossilábico, uma vez que não vi nada escrito. Tem de se perguntar tudo. Na entrada fica a sensação de se estar a tentar fazer "algo de esquisito". Também eu fui nesse Sábado, mas de tarde. Fui na última hora da exposição, antes de encerrar. Também eu me atrapalhei na porta principal de vidro e no percurso que ela impõe. Logo após a porta de vidro, o que surpreendeu foi a falta de indicações. "Seria aqui mesmo?", dúvida instantânea. Tinha pouco tempo para a hora de fecho, sabia, portanto indiquei sem delongas a um senhor solitário duma empresa de segurança se ainda poderia visitar a tal exposição. Foi simpático, indicando o pouco tempo que faltava. Vi uma série de controlos de acesso do tipo de entrada de supermercados (a imagem de metropolitano também serve, embora não do de Lisboa) mas afinal seria mais simples: o senhor carregou num botão e um acesso lateral abriu-se. "-Entre nesse elevador e prima o 2.", ainda ouvi. Rapidamente estava na exposição. O estranho era o vazio de pessoas. Uma exposição sem ninguém. A 20 minutos do suposto fim, mais duas pessoas surgiram. Vi a exposição até lá surgir em cima o mesmo segurança, novamente simpático, indicando-me que tinha de fechar, já eram 17h. Mas deu-me a boa novidade: "-Olhe que a Direcção decidiu prolongar mais uma semana a exposição". Retirei a última brochura da exposição, folheei o livro de comentários de outros visitantes (li quem notasse o mesmo vazio de gente noutros dias) e desci, agora pelas escadas, tendo desta vez uma menina da segurança a carregar no botão que abriu a portinhola de alumínio. "Perdi-me" novamente na porta-labirinto da saída. Fiz muito bem em ter ido e no fim precisava de mais tempo para ver tudo melhor. Fiquei feliz com o prolongamento da exposição e irei lá voltar durante esta semana. Espero poder comprar um catálogo.

Muito obrigado à organização por terem elaborado esta exposição, mas as notas do leitor P.B. têm sentido. O acesso é invulgar para uma exposição aberta a todo o público. Soube da exposição numa notícia de jornal fui ver mais no site na página da BN. Não esperava ter me sentir um pouco à entrada como um estranho que quer entrar em casa alheia. O que os visitantes sentem não é o excesso de vigilância (eu achei que ela é de menos). É certo que em tanto lado da Europa e EUA até pelo detector de metais passamos, contentes. Mas há gente, rebuliço, setas, sorrisos.
Tal como a leitora R.M., também eu não conheço mais ninguém que lá tenha ido. Como é que a Gradiva subsiste por cá, é que algo que desde criança me pergunto.
(Francisco Monteiro)

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Não pude nem poderei ver a exposição, mas o que me chamou a atenção no post de RM e na resposta da Bilblioteca Nacional foi a extraordinária presença e força do Abrupto. Presumo, pela maneira como estão redigidos, que os comentários de RM apenas tenham sido enviados para o Abrupto, e não, por exemplo, como um mail para a BN, com cópia para o Abruto. Acho fantástico que quase imediatamente surja uma resposta - boa ou má, neste caso é irrelevante - das Relações Públicas da BN. Isto confirma, se confirmações fossem precisas, que o Abrupto tem realmente uma presença enorme na comunicação. Essa presença implica, por um lado, que os comentários chegam aos "destinatários" e, por outro, que os "destinatários" se vêm obrigados a reagir. Claro que a função do Abrupto não é ser o "muro das lamentações" da sociedade portuguesa, mas tenho razões para desconfiar que se RM se tivesse limitado a enviar um mail ou uma carta à BN com as críticas que suscitou no Abrupto, ficaria talvez sem resposta. Na Suécia esta função é preenchida pelos jornais diários "sérios" têm uma a duas páginas de correio de leitores, onde se publicam cartas, ou excertos, sobre os mais variados assuntos. Umas vezes geram-se debates sobre determinadas questões, outras vezes apresentam-se críticas e, mais raramente, louvores. O certo é que quando se criticam empresas, instituições, serviços públicos, por exemplo, os visados são praticamente "obrigados" a reagir, e muitas vezes a alterar o seu comportamento. É uma arma fabulosa!
(Madalena Ferreira Åhman)

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Em 12-01-2005 fui á Torre do Tombo ver a Bíblia dos Jerónimos e depois descai e fui ver as exposições que estavam presentes na B.N. Não senti as dificuldades que referiu e fico surpreendido como encarou as medidas de segurança,imperiosas num tipo de instituição que alberga um património valioso e insubstituível,que é de todos nós,e que são assumidas em todas as congéneres,espalhadas pelo Mundo. O único pequeno senão foi os 30 m.que tive de esperar para ver a ex. sobre Portugal e o Oriente,por na altura o Prof.H.J.Saraiva estar a gravar o programa,que dias depois passou na "2". Efectivamente,ás vezes dizer mal é fácil!

PS. Durante os 90 m.de presença na B.N.,fui o único visitante das exposições,mas já estou habituado,pois há quatro ou cinco anos,quando visitei o Museu da Electricidade,percorri-o absolutamente sozinho,ao longo de 3h.

(A.L.B.Barrinhas)

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© José Pacheco Pereira
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