ABRUPTO

7.2.05


APRENDENDO COM S. TOMÁS DE AQUINO ACERCA DA CONSULTA AOS ASTROS

Antes de tudo, é necessário que saibas que a virtude dos corpos celestes se estende à moção dos corpos inferiores. Com efeito, disse Santo Agostinho no livro quinto d´A Cidade de Deus: “Definitivamente, nem sempre é absurdo dizer que determinados astros podem ocasionar mudanças nos corpos”. E assim, se alguém recorre aos julgamentos dos astros para conhecer de antemão certos efeitos corporais, como a tempestade ou a serenidade do tempo, o vigor ou a fraqueza de um corpo, a fecundidade ou infecundidade das colheitas, e coisas similares, que dependam de causas corporais e naturais, não parece haver pecado. Pois, todos os homens recorrem a alguma observação dos corpos celestes em vista de conhecer efeitos deste tipo: os agricultores semeiam e colhem em períodos exatos após a observação do movimento do sol; os marinheiros evitam navegar quando a lua está cheia ou nas noites sem lua; os médicos examinam as doenças em dias específicos, determinados pelo curso do sol e da lua. Donde não há inconveniente na consulta aos astros com relação a efeitos corporais, fundada na observação de estrelas menos evidentes.

Mas é preciso absolutamente compreender que a vontade do homem não está sujeita à necessidade dos astros; de outro modo, pereceria o livre arbítrio, e sem este, não se poderiam atribuir as boas ações ao mérito do homem, nem as más à sua culpa. E, por esta razão, todo cristão deve ter por certo que o que depende da vontade do homem — todas as obras humanas são desta espécie — não está submetido à vontade dos astros. Por isso lemos nas Escrituras (Jr. 10, 2): Não vos espanteis com os sinais dos céus; porque com eles os gentios se atemorizam.


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O meu nome é Ricardo Fidalgo, tenho 31 anos e exerço a profissão de Astrólogo, cumulativamente com a de Advogado.

Gostaria de lhe deixar uma frase que, de uma maneira geral, é aceite pela comunidade astrológica quando se debate a questão das previsões astrais: o que se prevê não é o resultado. É o desafio a enfrentar. Pelo que o livre arbitrio não é, em nenhum momento, posto em causa. Agora, o que pode, e muitas vezes assim sucede, acontecer é que face a determinado tipo de desafio o ser humano reaja de uma determinada maneira padronizada, sem que tal queira significar que em todos os casos tenhamos a mesma reacção.

Li alguns posts seus relacionados com Astrologia, e gostava de lhe dizer que a comunidade astrológica a nivel mundial cresce, não só em numero, mas tambem em profissionalismo e em capacidade de testar criticamente qualquer método (e existem muitos) astrológico de modo exaustivo. Claro que isso não resolve a questão de “acreditar” ou não na Astrologia enquanto método eficiente. Para isso, só há uma solução, para quem nisso tiver interesse: pegar em livros. Lê-los. Testar ao máximo o que se leu. E assim continuar durante um bom par de anos. Caso contrário vamos continuar com o tipo de atitude que vejo, por exemplo, numa televisão como a TVI, que num dia leva um Astrólogo ao Jornal da noite, e no seguinte transmite uma reportagem a desacreditar a Astrologia.

E já agora, nunca é demais realçar, que Astrologia é uma coisa, Bruxaria, Tarot, Reiki, Quiromância, e por aí fora, coisas totalmente distintas. Sem menosprezar qualquer das outras áreas em causa, meter tudo no mesmo saco só serve para confundir ainda mais quem não faz a minima ideia do que é Astrologia, e de como funciona.
(Ricardo Fidalgo)

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Perante textos como aquele que o seu leitor Ricardo Fidalgo lhe enviou, referente à Astrologia, fico sempre com a mesma dúvida: terá ele porventura lido livros sobre Bruxaria, Tarot, Reiki, Quiromância e por aí fora, testado ao máximo o que leu e assim continuado durante um bom par de anos para concluir que são «coisas totalmente distintas» da Astrologia? Caso contrário, como é que ele sabe?
(José Carlos Santos)

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Li o suficiente para ter a certeza de que o(s) método(s) astrológico(s) é(são) totalmente distinto(s). Não é necessário ler muitos livros para tirar essa conclusão. E reafirmo o que já disse: não pretendo, de forma nenhuma, menorizar qualquer das outras áreas mencionadas, sobre elas não me pronunciando dado faltar-me o conhecimento aprofundado, teórico e prático, que tal exigiria. Não faz mal nenhum termos opiniões abstractas sobre o que quer que seja. Mas ás vezes convinha descer á terra, meter mãos á obra, e Conhecer aquilo de que se quer falar. Conhecer, mesmo! E a informação está disponivel, não há nada de oculto.
(Ricardo Fidalgo)

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No seu comentário ao texto de S. Tomás de Aquino, o Sr. Ricardo Fidalgo (...) começa bem quando nos adverte que o número crescente de ignorantes que aderem à comunidade astrológica não serve de critério para a credibilizar, mas acaba mal, ao insinuar que o estudo da astrologia e o teste das suas previsões nos convenceriam da sua real natureza de ciência. Erro puro.

Comecemos pelas previsões:

Um dos ensinamentos elementares da estatística é o de que é extraordinariamente provável a ocorrência conjunta de dois factos improváveis. E se a associação entre os dois factos é estabelecida a posteriori, então deixa de ser uma probabilidade, para passar a ser uma certeza.

Ilustremos o que pretendo dizer. Logo a seguir ao 11 de Setembro, circularam pela net mails que salientavam as impressionantes coincidências registadas. Tão impressionantes, que não poderiam ser meras coincidências. Lembro-me que se dizia nesses mails, entre outros disparates, que o atentado tinha ocorrido no dia 11, precisamente o número formado pelo desenho das Torres e o número de letras contido na expressão “New York City”. O que não poderia deixar de envolver uma espécie de enorme sinal dos céus.

Obviamente que se o atentado tivesse ocorrido no dia 2, se diria que as Torres formavam o número 2 romano e se fosse no dia 7, quem passava a ter 7 letras era a simples expressão “New York”.

Quando se quer associar, pode-se associar qualquer coisa.

Aquando do atentado de que foi vítima Ronald Reagan, li na altura um artigo qualquer que salientava a trágica fatalidade de todos os presidentes dos EUA eleitos em ano zero (Reagan tinha sido eleito em 1960) estarem condenados a não completar o mandato. No artigo dizia-se “todos” e citava-se Kennedy (eleito em 1960). Não sei se aquela afirmação era verdadeira. Com o próprio Reagan e com Bush deixou de o ser*. Mas mesmo que o fosse isso não tinha nada de extraordinário. Em duzentos anos de História, terá havido uma dezena de presidentes dos EUA eleitos em ano zero. Esses presidentes, de certeza absoluta, têm milhares de coisas em comum. Que uma delas seja terem morrido antes de concluído o mandato é apenas mais uma. Tanto mais quanto é certo ser a morte segura e que todos eles dispuseram de 4 anos para cumprir o destino.

Todo este discurso, para concluir que não são meia dúzia de pseudo-previsões correctas (no meio de milhares de outras falhadas e habilmente esquecidas) que fazem da astrologia uma ciência. Sobretudo quando nessas previsões cabe tudo. Dizer-se que o Papa vai morrer em 2005 não é lá grande previsão (embora também o não fosse desde há uma boa meia dúzia de anos). Mas a maioria dos astrólogos limita-se a anunciar que vai morrer uma importante personalidade da Igreja Católica, o que não passa de uma banalidade.

Mesmo que um astrólogo tivesse acertado na previsão do dia, hora e dimensão do tsunami que varreu o oriente no fim do ano passado (um facto com a dimensão trágica daquele não podia deixar de estar inscrito nos astros com toda a clareza e visibilidade, para quem o soubesse ler), isso não bastaria para fazer da astrologia uma ciência.

Em primeiro lugar, era necessário que todos os astrólogos o tivessem previsto ou que, pelo menos, tivessem sabido reconhecer a sua inevitabilidade quando algum deles o anunciasse. É assim que se passa na verdadeira ciência. Um eclipse que é previsto por um astrónomo pode ser previsto e confirmado por todos. Ora, cada astrólogo faz as suas previsões e raramente (nunca, quando se desce ao nível do concreto) elas são coincidentes.

Em segundo lugar, não basta uma previsão certa. Todas as previsões têm que ser certas. Se uma só observação astronómica puser em causa as previsões decorrentes da teoria da relatividade de Einstein, esta será imediatamente posta em causa, como o foi a teoria da gravidade de Newton.

Contudo, a astrologia farta-se de falhar, sem que nenhum astrólogo a ponha em causa as suas bases.

É certo – como se apressarão a observar-me alguns – que a meteorologia também falha as suas previsões e eu não ponho em causa a sua natureza de ciência. Simplesmente, a meteorologia é (ao contrário da astrologia) a primeira a reconhecer a sua incapacidade para fazer previsões fiáveis. Por outro lado, os seus métodos são públicos e transmissíveis. Sabe-se quais as bases em que se fundam as previsões e a natureza incompleta dessas bases, que torna aquelas falíveis. Mas dois especialistas em meteorologia, partindo das mesmas observações, chegam às mesmas previsões. Não assim na astrologia, onde, com base nos mesmo dados, cada um chega às mais variadas conclusões.

Finalmente, a acabar, uma nota sobre o ónus da prova: é comum ouvir-se por aí, a propósito da astrologia, que não devemos desprezar uma ciência que não conhecemos e que ninguém provou que ela era falsa.

O ónus da prova cabe à astrologia, não à ciência. É a astrologia que tem que provar que é verdadeira, não a ciência, que ela é falsa. Eu posso sustentar a tese que cada um de nós é permanentemente seguido por um gnomo verde que só o próprio pode ver, mas que desaparece assim que tentamos voltar-nos, para o observar. Ninguém jamais demonstrará a falsidade desta tese.

* Os astrólogos dirão que, crente na astrologia, Reagan tomou as providências adequadas para quebrar o enguiço, não conseguindo evitar o atentado contra si mesmo, mas conseguindo evitar nele a própria morte e quebrando por essa via definitivamente o dito enguiço.
(António Cardoso da Conceição)

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