ABRUPTO

30.1.05


CRISE DE REPRESENTAÇÃO (3)


1.

O que se passou nos últimos dois dias na campanha eleitoral do PSD por responsabilidade directa de Santana Lopes, as afirmações baixas nos comícios, o cartaz sub-reptício cheio de insinuações sobre quem é que os portugueses conhecem ou desconhecem, um mundo de insinuações morais transformado em campanha eleitoral, levantam a suspeição sobre se não haverá uma campanha organizada de boatos que sirva de pano de fundo a esta guinada de campanha negativa tão pouco habitual em Portugal.

2.

É tudo demasiado grave e está a atingir um nível de insuportabilidade que todos, a começar pela gente séria e honesta do PSD, sentem indignação. Entre ontem e hoje muitas mensagens que recebi têm esse tom de revolta: “ponto de saturação”, diz-se numa delas.

Creio que se chegou ao ponto de saturação acerca do 1º ministro português em exercício (!!!). Acabou-se. Não vou perder nem mais um minuto a debruçar-me sobre o que ele disse e o que fez e por onde andou. Os limites foram já ultrapassados por mais de uma vez.” (E.P.)

Sou militante do PSD há 30 anos (…) , resolvi dar um grito de revolta. Basta. “ (O. M.)

E há muitas mais e mais duras.

3.

Muitos eleitores simpatizantes do PSD e muitos militantes, a quem não passa pela cabeça votar PS, dizem que se vão abster ou votar em branco. Nunca se conheceu uma situação destas no partido e no seu eleitorado.

4.

Há pelo menos uma coisa positiva que se pode fazer: ter as cotas em dia. Vai ser preciso.

5.

Voltaremos aqui.

PS. - Há alguma controvérsia sobre se são "cotas em dia" ou "quotas em dia". As duas palavras são usadas e uma consulta ao dicionário revela que ambas têm sentido idêntico. Salvo melhor opinião, fica para já "cotas" cujo uso é mais corrente.

*
Relativamente ao uso dos termos "cota" e "quota", gostaria de lhe dizer o seguinte:
1. Embora, actualmente, os dicionários refiram a sinonímia entre "cota" e "quota", quer-me parecer que essa identidade de sentido advém do mau uso que tem sido feito de um e outro termo.
2. Aprendi, no meu tempo de escola, que são coisas diferentes e as "quotas" a que se referiu são mesmo "quotas", isto é, com "q".
3. É que esta "quota" não se confunde com a outra "cota", a qual também significa "peça de armadura, nota ou referência à margem de um livro, parte oposta ao gume de instrumento cortante", o que é substancialmente diferente de "quota" entedida como "quinhão, prestação".
4. Esta última explicação é, aliás, a que consta do Prontuário Ortográfico e Guia da Língua Portuguesa, 24ª edição, de Magnus Bergström e Neves Reis, da Editorial Notícias, página 248.
5. Creio, pois, que o correcto é escrever-se "quota" no sentido em que o empregou para se evitarem as confusões.
(Sérgio de Almeida Correia)

Actualização: não é habitual no Abrupto fazer pesar o espaço do ecrã com muita correspondência de carácter exclusivamente político. Neste caso abre-se um excepção para se perceber melhor como as coisas se estão a passar. Embora as cartas (uma pequena amostra) sejam publicadas com iniciais, todas são de leitores identificados.

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Entre a minha casa e dos meus Pais somos quatro eleitores simpatizantes do PSD, dos quais dois não falham uma eleição vai para trinta anos, sendo que os outros têm sido mais intermitentes. Desta vez por obra e graça de PSL podem desde já contar com uma abstenção e três votos brancos. Por cá é aceite que o PSD pelos seus princípios e bases programáticas vale muito, mas não é indissociável do que alguém a cada momento quer fazer dele.

(JCB)

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Pelo pouco que valha, sou o militante (...) do PSD mas nestas eleições, com grande desgosto e angústia, não sou capaz de votar no meu partido.

Não posso, sequer, conceber que o meu voto sirva de justificação para o actual presidente do partido se possa manter nesse cargo após as próximas eleições, se julgar que obteve uma "derrota honrosa" ou qualquer outro resultado que considere menos mau.

Votar no PS, para mim, nunca seria alternativa. Não me parece que o Eng.º Sócrates seja muito melhor, ou muito diferente do Dr. Santana. Para além disso, traz com ele toda aquela gente do guterrismo que já governou o país com os resultados que são de todos conhecidos.

Em circunstâncias normais, perante a quase impossibilidade de votar no meu partido, votaria PP. Contudo, apesar da boa imagem que deram de si no governo (por comparação com a péssima imagem dada pelo PSD nos últimos meses), esse partido não deixa de ser liderado pelo mesmo Dr. Paulo Portas do Independente.

Perante este cenário, vejo-me forçado a votar em branco. Mas não perco a esperança. Sei que o PSD tem quadros de grande competência, tem gente muito capaz, que neste momento está afastada das cúpulas partidárias. Espero que as próximas eleições, pelo menos, sirvam para permitir a ascensão dessas pessoas, a bem do partido e do país. Porque sei que o PSD não deixa de ser um partido indispensável na nossa democracia e o único capaz de fazer as reformas de que o país tanto precisa.
(RP)

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O que pretendem as pessoas do PSD que, por terem chegado a um ponto de saturação, como dizem, se vão abster? Logicamente o PS no governo com maioria absoluta. Pensarão essas pessoas que José Sócrates é melhor e vai governar bem? Governar bem é tomar as medidas difíceis mas necessárias que o País precisa a longo prazo. Será a memória das pessoas tão curta que já esqueceram o que foi o Guterrismo? Facilitismo e governação à vista (por sondagens) a curtíssimo prazo, medo (pânico) de qualquer manifestação e cedências constantes a todos os grupos organizados. Distribuição de milhões a rodos para calar qualquer crítica, jobs for the boys, e, no final, uma saída em passo acelerado pela porta das traseiras que a crise vem aí, e quem vier atrás que feche a porta. E agora querem mais do mesmo? Como diz MRS, Sócrates é Guterrismo de segunda. Não há ponto de saturação nem nada que justifique a abstenção. Se há gente capaz dentro do PSD, então o que é preciso é que essas pessoas cheguem à governação. O 1º ministro até pode ser ignorado.Quem tem influência no partido que se chegue à frente.
(JAL)

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Como muitos outros militantes do PSD e que sempre votaram no Partido, mesmo quando as dúvidas eram muitas, caso das últimas eleições para a CM de Lisboa, o meu voto será em branco, pela primeira vez. Apesar das vozes discordantes que me dizem que será dar a vitória a um PS que neste momento é, parafraseando Sir W.S. Churchill, um enigma envolto num mistério, (como vai cumprir?! o que prometeu?), não me é possível votar na proposta do PSD. Aliás, em caso de reincidência, do presidente eleito, para a CML (vai ver), o meu voto será no mesmo sentido.

Como tenho contactado com outros militantes da mesma área, a confusão é enorme e mesmo os que estão mais inclinados a votar CDS/PP (acho que vai eliminar esta sigla nos tempos mais próximos, com a mesma cara que lhe deram os genes) encaram seriamente a hipótese de votar branco. A maioria absoluta vai ser alcançada com a abstenção de muitos.
(JJN)

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Ao ler o seu blog, senti a necessidade de reforçar a ideia e de lhe confessar o seguinte (e é a primeira vez que conto isto a alguém): tenho 34 anos, nunca me abstive em nenhuma eleição e sempre votei PSD - apesar de não ser militante.

Assim se vê que sou um eleitor típico do PSD, que vota apenas com a sua consciência e sem a "obrigação" de obedecer a qualquer disciplina partidária. No entanto, sendo certo que não votarei nas próximas legislativas noutro partido, repugna-me agora votar PSD...

Talvez acabe por votar PSD, na medida em que esta eleição vai eleger um parlamento que há-de continuar para além desta liderança. Ou seja, talvez vote no escuro - talvez vote PSD na expectativa de que há-de vir outra liderança e que, essa liderança vindoura terá mais dificuldades se o PSD tiver obtido uma votação vergonhosa (o que o meu voto não irá impedir)...Mas, sinceramente, ainda não me decidi...

Feito este desabafo revoltado, desiludido e politicamente magoado, espero contribuir para que quem se preocupa com o partido possa fazer o diagnóstico político/sociológico da actual situação...E estou em crer que, como eu, muitos mais eleitores enfrentam o mesmo dilema...
(JMF)
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Tenho seguido com muita atenção as suas notas sobre a "Crise de Representação", pelo simples motivo de me parecem mais representativas do estado de alma de muitos de nós, do que a simples condição miserável a que chegámos, de termos que escolher entre o Dr. Santana Lopes e alguém que tem tanto de Guterrismo de segunda como de Santanismo recauchutado.

Neste momento, é imperioso manter a cabeça fria e a visão límpida! Todos reconhecemos que o Dr. Santana Lopes não é o tipo de líder que precisávamos, mas o Dr. Jorge Sampaio também não é o tipo de Presidente da República que o país precisava... E qual é o tipo de Presidente da República que o país precisa? A eleição do próximo "Presidente da República" é uma "variável" sob o nosso controlo? Não me parece; por outra, é mais prudente não contarmos com isso.

A pergunta impõe-se: por causa de um problema interno mal resolvido, vamos hipotecar o futuro do país durante pelo menos mais quatro anos? Será que "dar um tiro num braço" para chamar o partido à realidade/Terra (abstenção/votos em branco), não é TUDO o que o PSD podia fazer de pior pelo futuro do nosso país? Não será isto o cúmulo do NOSSO egoísmo?

Ao contrário do que alguns dos leitores do Abrupto consideram, não me parece que o refúgio na abstenção/voto em branco seja uma demonstração de força das bases do partido; parece-me sim uma falta de força vital/regenerativa preocupante/doentia e que me parece completamente afastada da realidade.

... Uma verdadeira posição de força das bases do partido, é conseguirmos o melhor resultado que nos fôr possível conseguir nas próximas eleições. Vamos precisar desse resultado para não dependermos do Presidente da República (seja ele quem fôr) para derrubar um governo PS caso haja essa necessidade. Posição de força é mobilizarmo-nos JÁ e estarmos preparados para no dia 21 de Fevereiro, tenha o PS maioria absoluta ou não, tenha a coligação PSD/PP maioria absoluta ou não (algo que acho que está a ser substimado), apresentarmos 2.500 assinaturas para convocarmos um Congresso Nacional extraordinário o mais rapidamente possível!

Diga-me, já que conhece o funcionamento do partido melhor que eu... Mesmo no caso de um Congresso Nacional extraordinário, os órgãos nacionais do partido têm capacidade de influência significativa na eleição dos Delegados? Se tiver, temos que mudar isso rapidamente e cada um de nós vai ter que trabalhar activamente para evitar que tal aconteça; se não tiver, tanto melhor.

(HJBA ( militante n.º...))

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Aparentemente muitos, e o próprio JPP, têm vindo crescentemente a defender – no mínimo, a divulgar – a ideia que, de tão mau que é Pedro Santana Lopes, tudo lhe é preferível. Quando digo tudo, digo uma maioria absoluta do PS, uma maioria relativa do PS ou, no limite, uma coligação maioritária da esquerda (tradicional).

Não sendo um admirador de PSL, pelo contrário, tenho fundadas dúvidas que tal corresponda à realidade, e tenho inequívocas certezas do quanto inverdadeiro é, se olhar ao estrito interesse do país. Assim, leio a “animosidade” eleitoral do PSD para com o actual Primeiro-Ministro como reflexo de apreciações meramente político-partidárias, as quais – considerando a fase aguda de desenvolvimento económico e social que o nosso país atravessa – deveriam merecer reflexão noutro tempo e noutro espaço.

E a propósito desse outro espaço, interessaria mais tarde perceber porque elegem os militantes do PSD dirigentes em quem os eleitores do PSD não votam. E que consequências daí resultam para aqueles, e que responsabilidades políticas efectivamente se apuram. Mesmo para aqueles que, por comodidade e/ou omissão, se demarcaram da eleição da actual direcção do PSD.

(JM)

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Para onde vamos como país? Cheguei a um ponto que não sei o que fazer. As alternativas não são nada atraentes. Votei sempre no PSD (tenho 42 anos) mas desta vez não posso, porque não aguento tanta inabilidade, tanta incompetência e tanta demagogia. Não suporto pessoas que se estejam sempre a culpar os outros de tudo de mal que acontece e em permanente vitimização. Mas então que fazer? Votar no PS? Não, nunca, ainda tenho memória e lembro-me bem do "pantano". Nos partidos mais à esquerda? Nem pensar, o que ouço faz-me crer que seria desastroso se algum deles tivesse acesso ao poder através de uma eventual coligação. No PP? Não, a sua inflexibilidade em relação ao aborto seria suficiente, mas o pior é que o Sr. Paulo Portas já mostrou que pode quebrar o acordo com o PSD o que mostra que é capaz de tudo e tem um profundo apego ao poder, que nem sequer nos deve deixar admirados pois já sabiamos. Estando a abstenção fora de questão, por me sentir moralmente compelido a votar sempre, a alternativa é o voto em branco. Mas assim, será sempre mais um prego para o caixão onde o PSD está metido, pois a sua derrota é certa, só não sabemos a dimensão da mesma. Como chegamos até aqui? Somos um povo assim tão mau que dele não consegue emergir uma alternativa credivel para governar o país?
(RBM)

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Sou mais um simpatizante do PSD que não se sente representado. Desde que voto, há 12 anos, intercalo votos em branco com votos no PSD. Não sou militante, mas sempre me identifiquei desde que me conheço com o Partido Social Democrata. Cresci a admirar Cavaco Silva, hesitei com a liderança de Fernando Nogueira, fui solidário com Marcelo Rebelo de Sousa, apoei Durão Barroso e desprezo Santana Lopes.

Não admito votar PS. Já me passou pela cabeça, o que é em si mesmo grave, mas não o farei. Serão governo, talvez com maioria absoluta, mas não com o meu voto. Não votarei PP. Já me passou pela cabeça, o que é em si mesmo grave, mas não o farei. Agora faz-se passar a ideia de que tiveram bons ministros. Mas na minha área profissional, não posso esquecer Celeste Cardona, a pior ministra da Justiça que este país já teve. O Bloco de Esquerda não é hipótese. Já me passou pela cabeça, o que é em si mesmo grave, mas não o farei. A ideia de um governo PS refém dos deputados do BE é assustadora.

A aparente solução seria votar em branco. Mas isso não contribui para o essencial nestas eleições. Santana Lopes tem de ser esmagado, para ir embora (não sendo um dado adquirido que vá embora, mesmo esmagado). Ora o voto em branco não contribui para esmagamento de PSL, porque não é contabilizado em termos de percentagem juntamente com os votos válidos. Ou seja, não torna o resultado do PSD pior. A única solução, embora pareça politicamente irresponsável, é escolher aleatoriamente um dos partidos pequenos sem hipótese de representação parlamentar. Não é um voto inútil porque conta para a aferição dos resultados e, na sua ínfima proporção, piora o resultado do PSD.

É esta a minha opção. Esperemos que após as eleições o Partido volte a ser liderado por gente competente.
(SMP)

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© José Pacheco Pereira
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