O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: COM OS DEDOS OU COM AS MÃOS (3ª série)
"Relativamente ao comentário do leitor Manuel João Bóia e em jeito de resposta recomendo vivamente a leitura atenta dos posts do Paulo Querido , bem como dos diversos artigos para que apontam os links que ele lá tem. Talvez o leitor chegue à conclusão que ofertas de colaboração e análises diversas não faltaram. Talvez tenha havido, isso sim, autismo dos nossos governantes."
(Dionísio Leitão)
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"Sobre a questão dos problemas NP, P, e afins, queira verificar o seguinte link Eu não tenho muita experiência em lidar com aplicações de software que tenham uma dimensão que não possam ser globalmente compreendidas por uma só pessoa. Sei no entanto o suficiente para dizer que num quadro destes, a solução miraculosa do programador sobredotado é algo que, salvo melhor opinião, enferma de alguma ingenuidade. Ainda neste contexto, são muitos os exemplos, mesmo em países com outras posturas de controlo dos seus processos de desenvolvimento, de projectos de software que ou ultrapassam o prazo inicialmente previsto, ultrapassam o orçamento, uma combinação das duas, ou não chegam sequer a ver a luz do dia. Portanto, não é novidade este tipo de acontecimentos. Normalmente, a principal razão atribuída como causa para esse descarrilamento é a subestimação dos problemas e dificuldades associados ao projecto.
Mas sinceramente, e isto é pura especulação porque não disponho de dados concretos, o problema estará mais ligado à própria especificação da aplicação. Pergunta: com a actual legislação (leia-se regras de ordenação) a frase "o professor A está colocado à frente do professor B" é verdadeira, ou falsa? Ou não se consegue responder de todo? Se não se conseguir responder a estas perguntas para todos os professores (e esta é uma fase muito anterior sequer a começar-se a modelar a aplicação) de forma consistente e completa, então não há solução informática para o problema. Ser consistente significa que, com o conjunto de regras definido, de forma alguma a frase atrás referida pode ser simultaneamente verdadeira e falsa, e completa significa que deve ser sempre possível atribuir um dos valores lógicos (verdadeiro ou falso). Como referi no inicio, este comentário não passa de especulação, mas este é um problema comum quando se pretende automatizar um conjunto de processos, regras e procedimentos, isto é, constatar-se que essa doutrina não é completa ou é inconsistente.
Noutro âmbito, mas ainda sobre o mesmo tema, é de certeza uma bricadeira dizer-se que nunca antes houve problemas nos concursos de professores. Este será concerteza o problema mais grave, mas daí a dizer-se que os concursos nos anos anteriores foram modelos de perfeição vai uma grande distância?
Acima de tudo, está a procurar-se uma solução técnica para um problema político de organização social. Ainda ninguém me conseguiu explicar porque é que um Conselho Directivo que seja responsável por 3000 alunos, uma série de professores e funcionários, não tenha a competência e autonomia para ser ele a contratar o seu corpo docente. Obviamente que isso implicaria uma responsabilização relativamente aos resultados (dos alunos) e, relativamente a esses, é sempre muito mais fácil responsabilizar os malandros dos políticos em geral e o governo em particular. Mas acredito que ainda virá o tempo..."
(José Coelho)
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"Tem razão Miguel Gonçalves Sousa. O problema da colocação dos professores é, de acordo com as regras definidas na lei dos concursos, um problema NP. E podia ter ido mais fundo na explicação da complexidade do problema. Tomo a liberdade de seguir o seu raciocínio: se o último professor da lista, a ser colocado, libertar uma vaga que interesse ao primeiro da lista, o baralho vai ser novamente distribuído. Esta redistribuição deve-se, portanto, a uma causa bem identificada, a colocação do último professor da lista numa determinada escola. Mas que garantia há, no fim da segunda distribuição, de que esse último professor vai ficar colocado? Nenhuma. E se não ficar? Então já não liberta a vaga para o primeiro da lista.
A questão pode expor-se de outra forma. Suponhamos que um computador potentíssimo disponibilizava todas as combinações possíveis de colocação dos professores. Googles de hipóteses diferentes. Algures nesse palheiro há-de esconder-se a agulha, isto é, a melhor de todas as soluções. Mas é possível, é provável, que até essa solução borgesiana esteja ferida de ilegalidade. Mesmo na agulha pode haver uma vaga ocupada por um professor que estava atrás de outro, ambos concorrentes a essa vaga.
É por isso que JPP tem razão quando repetidamente defende a importância das ciências exactas. Um legislador avisado daria conta da subtileza que distingue a “solução ideal” da “melhor solução” e, no corpo da lei, estabeleceria os contornos matemáticos dessa diferença. Um técnico competente dominaria heurísticas, como os algoritmos genéticos, que integradas no software fizessem aparecer, num computador normal, a solução óptima.
O problema maior é que estão criadas as condições para alterar o carácter nacional dos concursos. Por ignorância, porque dá trabalho tentar perceber o que realmente aconteceu, porque toda a gente decidiu que isto não funciona, mais cedo ou mais tarde, vão cumprir-se os desígnios de José Manuel Fernandes: os concursos terão carácter municipal. Ao abrigo da fixação dos docentes – está por provar que seja coisa boa –, ao abrigo da ligação ao meio – está por provar que seja coisa boa –, ao abrigo do desejo de descentralizar – está por provar que seja coisa sempre boa –, as escolas vão cair nos braços das autarquias – está por provar que não seja coisa ruim. E como o escrutínio dos processos municipais é quase nulo, nunca mais a colocação dos professores fará cair ministros ou fará abrir telejornais.
Pode ser que alguém se lembre de que a regionalização do país garante as virtudes do centralismo e rejeita os defeitos do municipalismo. Eu votei sim no referendo da regionalização. Mas cada dia que passa mais me vai parecendo que fui o único."