ABRUPTO

28.8.04


OUVINDO HOROWITZ EM MOSCOVO

Este é um dos discos em que, se não fosse gravado ao vivo, se perdia metade da força. O concerto, em 1986, foi um daqueles momentos de emoção única na história da música ao vivo e uma bofetada na tragédia cultural e histórica do comunismo soviético. Horowitz, que deixara a sua Ucrânia em 1925 para o exílio, aparecia agora anunciado num único cartaz que dizia “Recital de piano de Vladimir Horowitz (USA)” nas paredes do Conservatório de Moscovo. Bastou para se fazerem filas pela noite dentro. O Conservatório de Moscovo é uma casa muito especial e quem teve a sorte de assistir a concertos na sua sala nobre (eu tive-a várias vezes) sabe que o que se respira lá está na essência do que é a cultura ocidental: um público de amadores, no melhor sentido da palavra, um público intenso e entusiasta, de gente que sabe o que ouve e gosta da música. Ponto. É esse público que perturba neste disco, tanto quanto as interpretações sem paralelo de Horowitz. O pianista começa com Scarlatti e Mozart, e o público bate palmas. Mas a coisa começa a aquecer quando Horowitz se transcende em dificuldade e beleza com Scriabin, Liszt , Schumann, Moszkowski e Rachmaninov e, a cada momento, na exacta altura em que ainda soa no ar o último som do último acorde, a assistência rompe num imediato “bravo” , num italiano “bravo”, de pura emoção.


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© José Pacheco Pereira
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