ABRUPTO

11.5.04


FORMAS DE ECONOMIA DA INDIGNAÇÃO

Foi publicada recentemente a lista dos dez piores lugares do mundo para o exercício do jornalismo em 2003, elaborada pelo Comité para a Protecção dos Jornalistas (CPJ): Iraque, Cuba, Zimbabwe, Turquemenistão, Bangladesh, China, Eritreia, Haiti, Cisjordânia, Faixa de Gaza, Rússia. Usarei esta lista para fazer uma espécie de geografia do mal.Agora seria interessante ver, em termos de espaço de indignação, que lugar cada um ocupa na escrita jornalística “indignada” – notícias de “jornalismo de causas”, editoriais, comentários de opinião. Imediatamente se podiam excluir os conflitos sem aparente interesse geo-estratégico, nos fundos malditos do Terceiro Mundo - Bangladesh, Eritreia, Haiti –, ou os lugares demasiado exóticos como o Turquemenistão. Como, em nenhum caso, parece haver um envolvimento especial dos EUA, ninguém se interessa. O caso do Haiti até seria interessante de analisar em separado, mas deixemo-lo de parte para já.

Depois há os desinteresses da indignação em que Cuba e o Zimbabwe têm papel relevante, com dois regimes “anti-imperialistas” e socialistas. Cuba costuma ter duas ou três frases de desobriga, mas não é preciso nenhuma lupa para perceber que há mais incómodo do que indignação. O Zimbabwe quase que só é uma questão britânica, vista com desinteresse generalizado. A China é atacada mais pelo crime da sua economia de mercado do que pelo crime do seu comunismo. A Rússia merece grandes silêncios. O Iraque, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza já, pelo contrário, acumulam as indignações, o que tem todas as justificações. Mas, mesmo assim, as indignações são selectivas e seria difícil encontrar quem se tenha indignado com as violências palestinianas contra os jornalistas, também referidas no relatório do CPJ.

Critérios objectivos para medir o que digo? As escolas do jornalismo do futuro farão esse estudo, mas não seria difícil desde já medi-lo usando a frequência e o valor simbólico dos adjectivos utilizados e os metros quadrados de prosa e de tempo de antena.

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© José Pacheco Pereira
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