ABRUPTO

30.4.04


MOVING PICTURES

O Guggenheim em Bilbau tem fama de valer a pena ser visitado pelo edifício de Gehry, mas de, como museu, “ter poucas coisas”. Tem de facto “poucas coisas”, mas as que tem – na grande sala de pop arte por exemplo, exigem aquele espaço interior imenso para se “verem”. A dimensão conta e muito para se verem as Venus de Dine ou o ferro ondulado dos caminhos interiores das esculturas.


Mas, como a sorte me protege, está no museu uma exposição das mais interessantes para se perceber, a quente, o frio devastador do discurso estético contemporâneo. Solidão, morte, terror, gestos áridos, perplexidade sem respostas, fealdade, solidão, outra vez em tudo, aparece nas fotografias, nos filmes, e nos objectos de Moving Pictures.

As fotos de James Casebere de espaços interiores artificiais, espaços-tipos que não existem em lado nenhum, espaços-tipo da prisão perfeita, da cela perfeita, do asilo-perfeito, da arrumação-perfeita.

Um pequeno filme de vídeo de Patty Chang, duas figuras humanas que frente a frente comem um ovo ou uma cebola, com as bocas quase sem distância no que podia ser um jogo, mas é uma encenação corporal da violência.

Uma imagem ao espelho de Douglas Gordon sobre um pecado mais original do que o original: “Guilty”.

De novo, o corpo como nunca o vemos em pequenos vídeos minimalistas de Ann Hamilton. Agua a escorrer, seixos na boca. Não é natural ter seixos na boca. Nada é natural, tão próximos da trivialidade e nesse pequeno gesto de mastigar, mover, seixos redondos na boca, e há um calafrio de estranheza. Nós somos assim / nós não somos assim / nós não queremos ser assim / nós somos assim, irreconhecíveis.

Mas o mais devastador é um vídeo de desenhos animados de William Kentridge, entre a banda desenhada e o desenho expressionista. Só visto.




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© José Pacheco Pereira
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