GUERRAS VÁRIAS – COMENTÁRIOS E CONTRIBUIÇÕES DOS LEITORES DO ABRUPTO
Guerra peninsular e Wellington -
“Quem conhece os "dispatch of general lord Wellington" penso que numa edição de 1852 (Havia uma coleção no British Council, neles um dos volumes é o da guerra peninsular..devia ser leitura obrigatória dos portugueses porque lá são mencionadas algumas das nossas "características"..já nesse tempo Quanto ao "Boney" é melhor não falarmos..segundo a tradição sou proprietario de umas oliveiras que serviram cerca de 1811 como forcas para uns portugueses!!!”
(A. R.)
Guerra civil portuguesa –
“A sua sugestão da programação patrocinada por utilizadores é muito boa. Permitiria debelar um dos grandes escolhos dos que fazem trabalho voluntário, que é o acesso a material e conhecimento especializado, e que não é justo esperar que seja cedido em troco de nada. No entanto os custos só seriam suportáveis se houvesse bastante gente disposta a financiar os projectos. Uma Associação poderia desempenhar esse papel, mas o espírito associativo é escasso em Portugal. Enfim, pode ser que haja alguém interessado em desenvolver a ideia."
"A propósito do post "Guerra Civil Americana" recomendo a leitura do Lincoln de Gore Vidal, bem como os outros volumes da série histórica, nomeadamente Burr e 1876".
(Joana Gomes Cardoso)
De arqueologia , um muito interessante episódio da guerra civil americana que tocou os Açores:
"Curioso mesmo é saber que a nossa ilha Terceira está umbilicalmente ligada à Guerra da Secessão. Para além do armamento na baía do Fanal do Erica, mais tarde o infame e conhecidíssimo CSS Alabama, temos o caso Run'Her. Durante os últimos anos da guerra civil, os navios do Sul que furavam o bloqueio dos portos imposto pelo Norte eram, geralmente, propriedade do governo Confederado. Essa propriedade era, no entanto, camuflada de modo a se evitar que os navios fossem classificados como "vasos sob um pavilhão nacional" o que poderia levar a que se vissem submetidos às regras estritas de neutralidade exigidas para navios de guerra e de transporte.
Sofrendo de uma falta crónica de crédito estrangeiro, o governo Confederado viu-se obrigado a estabelecer contratos de aquisição de navios junto de seis grandes construtores navais britânicos, fornecendo estes últimos navios equipados com maquinaria de alta tecnologia por troca com carregamentos de algodão - só quando o número de fretes executados fosse suficiente para amortizar a dívida de construção receberia o governo Confederado o controlo completo do navio em causa.
No âmbito do programa Confederado de construção de navios especificamente destinados a furar o bloqueio, foi lançado à água, a 3 de Março de 1863, o The Southerner. Com com cerca de 90 metros de comprimento e 300 cavalos de potência, apresentava pela primeira vez na história da construção naval mercante uma caldeira com superaquecimento de vapor e um casco reforçado com blindagem. Este navio, com 18 nós de velocidade de ponta, viria a dar o mote para aquilo que seria a construção naval em 1864. Nesse ano, saía dos estaleiros de Spence Pile, West Hartlepool, o vapor de pás Whisper, com 80 metros de comprimento e uma velocidade de 14 nós. Partindo de Falmouth a 16 de Novembro de 1864, o Whisper fazia parte de uma frota de quatro furadores de bloqueio que carregavam quase exclusivamente equipamento destinado à construção de minas navais de detonação eléctrica (uma nova arma de destruição e uma das muitas a surgir deste conflito). Destes quatro navios, o Whisper foi o único que conseguiu furar o bloqueio, após ter escalado Angra a 26 de Novembro de 1864. Dos outros, dois foram apresados e o último, o Run’Her, naufragou na Baía de Angra do Heroísmo.
Pelas informações recolhidas no Arquivo Distrital de Angra do Heroísmo, sabe- se que coube ao cidadão americano Hunter Davidson, a tarefa de coadjuvar o capitão do Run’Her, Edwin Courtenay, na manobra do navio. Hunter Davidson, nascido no estado da Virgínia em 1827, foi nomeado para o cargo de guarda-marinha a 29 de Dezembro de 1841, após ter concluído os seus estudos na United States Naval Academy de Annapolis, Maryland, naquele que foi o segundo curso a ser ministrado nesta instituição. A sua carreira naval prosseguiu com a sua nomeação a tenente, no ano de 1855 e terminou cinco anos mais tarde quando Hunter apresentou a sua resignação, pouco antes de se juntar à população rebelde do seu estado natal.
É durante o decorrer do primeiro ano do conflito armado que Davidson é nomeado para o posto de 1º tenente da Marinha Confederada, em Junho de 1861. Durante a guerra veio a ocupar vários cargos, quer embarcado, quer em terra, distinguindo-se pelo papel que desempenhou aquando da primeira escaramuça havida entre dois navios couraçados, o CSS Virgínia e o USS Monitor. Após o fim da sua comissão de serviço a bordo do CSS Virgínia, Davidson dedicou-se de corpo e alma à idealização de minas submarinas, tendo sido assistente de Matthew Fontaine Maury, brilhante cientista naval. Quando este último foi destacado para serviço de investigação na Europa, Davidson tomou a peito as tarefas de melhoramento, construção e posicionamento de minas navais no interior do leito do rio James, no âmbito do plano de defesa da capital sulista, Richmond, tendo os seus esforços sido amplamente recompensados com o afundamento de vários navios nortistas. Davidson foi também o responsável pela formação do Naval Submarine Battery Service, serviço este que respondeu pelo afundamento de algumas dezenas de embarcações da União. Em 1864 Davidson foi promovido a comandante - após um semi-submarino por si comandado ter, num ataque particularmente bem sucedido, danificado seriamente a fragata a vapor USS Minnesota, naquela que foi uma das primeiras operações bélicas de um submarino em teatro de guerra. m meados de 1864, Davidson tinha concebido um sistema eléctrico altamente sofisticado de detonação de minas navais o que o tornou no maior perito, a nível mundial, em armas deste género. Devido à dificuldade em obter nos estados Confederados as matérias primas e os equipamentos necessários para esta nova arma, Davidson foi destacado para a Inglaterra onde veio a trabalhar com os maiores especialistas ingleses nas áreas da telegrafia subaquática e dos explosivos.
Entre os vários materiais usados - e embarcados no Run’Her - contavam-se vários tipos de acumuladores e baterias eléctricas, cabo eléctrico submarino isolado, equipamentos de ebonite destinados a tornar as minas estanques, interruptores de telégrafo, sistemas de teste, detonadores e estruturas de minas por construir. Estas minas eram extremamente eficientes, extremamente mortíferas e desesperadamente precisas num teatro de operações que se caracterizava pelo domínio naval do Norte Construído pelos estaleiros de John & William Dudgeon, em Isle of Dogs, Londres, o Run’Her possuía cerca de 70 metros de comprimento, 8 metros de boca e 3,5 metros de calado, deslocando cerca de 343 toneladas. Partindo de Londres, com 50 pessoas de tripulação, o vapor demorou quatro dias a chegar à Terceira onde veio naufragar no interior do porto, ao que parece por culpa do capitão Edwin Courtenay.
O jornal O Angrense dá-nos um breve sumário do desastre: "Sinistro - Sábbado 5 do corrente, pelo meio dia, pouco mais ou menos, aproximou-se deste porto o vapor inglez Runher, de 343 tonelladas, capitão E. Courtenay, com 51 pessoas de tripulação, com carga de víveres, proveniente de Londres, com destino para as Bermudas, trazendo 4 dias de viagem. Ao entrar no porto, seguindo a toda a força, passou entre os navios ancorados e tomando um bordo bastante à terra encalhou junto ao cáes da alfandega, a bem pouca distancia. O commandante, a cuja imprudencia só se deve tal sinistro, fez esforços para recuar o navio, mas foram baldados. O navio era a primeira viagem que fazia. O commandante precipitou-se, porque se tivesse esperado o pratico, teria fundeado sem perigo algum junto ao outro vapor que se achava no porto. São sempre africanadas que custam caro aos donos dos navios e que podem desacreditar o porto."
No próprio dia em que era dado à estampa o Boletim Oficial que noticiava o naufrágio, era arrematado, por 800$000 reis, o casco do vapor com todo o seu recheio, à excepção da máquina e de uma caixa COM platina. Infelizmente para o comprador, enquanto que a 19 de Dezembro de 1864 se procedia à arrematação pública dos salvados do Run’Her - que subiram em geral a um preço fabuloso - o navio era completamente destruído por um vendaval, na noite do mesmo dia. Parte da sua carga permaneceu ainda em Angra, tal como se pode comprovar pela aquisição por parte dum navio inglês proveniente do México de vários caixotes de carne provindos da carga salvada, a 9 de Abril de 1865, cinco meses depois do naufrágio.
Após o naufrágio do Run’Her, Davidson regressou a Inglaterra - tendo partido de Angra para Lisboa a 18 de Novembro de 1864 no vapor português Maria Pia que transportava também trinta e cinco marinheiros ingleses - onde veio a assumir o comando de um outro navio procedente dos estaleiros Dudgeon, o City of Richmond. Este navio - transportando também equipamento destinado à construção de minas navais - foi desviado da sua viagem inaugural para ir prestar assistência ao couraçado CSS Stonewall. Este atraso foi o suficiente para o que o City of Richmond visse chegar o fim da guerra antes que pudesse vir a atingir qualquer porto Confederado. Depois da guerra, Davidson nunca chegou a regressar aos Estados Unidos. Serviu como oficial de marinha em diversas forças navais da América do Sul e chegou mesmo a combater na Guerra da Tripla Aliança contra o Paraguai. Davidson serviu também como consultor tecnológico no fabrico de minas navais e torpedeiros até à sua morte, em 1913, no Paraguai."