ABRUPTO

25.10.03


PESSOA, AUTOR DE BLOGUES

Que blogue magnífico dariam frases fragmentárias como esta horaciana:

UM EPICURISMO feito de abdicações...
Toda a nossa arte deve ser a de reduzir ao mínimo o elemento doloroso dos prazeres - a fúria que queiramos pôr neles, o desejo de que durem para além do que podem durar, a saudade inútil do que foram...
Uma abdicação lúcida e tranquila, um culto pensadamente ingénuo de si mesmo e dos próprios vícios, se eles se prestam a esse culto.


Ou este exercício à volta da frase de Wilde sobre como “most people are other people”:

O ARISTOCRATA é o que não obedece; por isso, por sua natureza de não obedecer, degenera em não obedecer a convicções que tem, em não obedecer a si próprio. Daí o facto das aristocracias acumularem em geral a teoria moral e a corrupção prática ambas em alto grau e consciente e sinceramente.
O aristocrata é o indivíduo que sente a necessidade de agir diferentemente dos outros. Ao passo que o burguês deseja agir conforme a regra geral, o aristocrata pretende o contrário. Ele é o que age por si. Ele e ele, não os outros, como dizia o Oscar Wilde da maioria da gente. (…). O aristocrata é a forca desintegrante, do progresso, anarquista. 0 povo é que é a força conservadora. Na classe media, basilarmente povo, adoptadamente aristocrática, dá-se o equilíbrio de tendências que mostra o estado social, a norma vital da sociedade.
Aristocratizacão total = anarquizacão. O individualismo é limitado. Há gente inindividualizável.


Ou, por último:

UMA ÁRVORE NÃO VAI a comícios. Urna pedra não tem na ponta da língua (que aliás não possui) tudo o que afinal Karl Marx nunca disse ou quis dizer.

Tudo isto em mais uma série de textos saídos da arca infinita: Fernando Pessoa, (Edição de Richard Zenith), Escritos Autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal, Lisboa, Assírio e Alvim, 2003.


(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]