ABRUPTO

25.10.03


DUPLA “DUPLICIDADE”

O Retórica e Persuasão perguntava-me sobre as razões porque usei uma frase, que tinha publicado no Abrupto, num artigo do Público. Reproduzo aqui as perguntas e os meus comentários. A questão suscitada interessa-me porque a inter-comunicabilidade entre diferentes meios de comunicação (blogue, audiovisual, escrita) é para mim um problema, ao mesmo tempo teórico e prático. E não me esqueço de que, numa das minhas primeiras notas no Abrupto, eu remetia para uma resposta mais completa a uma determinada questão para um debate do Flashback, que já estava gravado, e isso provocou a fúria de alguns autores de blogues, como se fosse uma violação do ethos da blogosfera.

Aliás, sou frequentemente incitado (algumas vezes provocado) a escrever sobre determinados assuntos e, se não o faço, imediatamente criticado, com a demasiado rápida excitação de alguns blogues, principalmente os de jornalistas, que têm tanto speed que depois se cansam depressa. Muitas vezes, como já disse o que queria dizer e como o queria dizer noutro tempo (a memória não tem para mim quinze dias, nem quatro Expressos, nem dois meses de TSF), ou noutro sítio, não me vou repetir.

1) Tratou-se de mero lapso [o conteúdo de tal post na sua crónica no Publico ] ou de uma decisão consciente?

De uma decisão consciente. O texto fazia parte de um cluster, para usar um anglicismo em moda, de reflexões fragmentadas que coloquei no blogue. Depois evoluíram para um texto mais extenso que pensei publicar no Público (parecia-me um assunto com interesse geral, e a forma de um Dicionário permitia-me acrescentar e cortar algumas notas, e pode ser que no futuro algumas dessas notas venham para o Abrupto). O meu uso dos media a que tenho acesso é comunicante, utilizo o que me parece mais conveniente conforme a natureza dos media e do que pretendo dizer ou escrever.

2) E a confirmar-se a segunda hipótese:

a) dever-se-á reconfigurar a "novidade" como requisito da publicação jornalística?


Não penso que a “novidade” seja o elemento fundamental, embora tenha em conta que o artigo deve ser no essencial inédito para o grande público do Público. Como o jornal tem muitos mais leitores do que o blogue, e a parte que aproveitei do texto do blogue era apenas uma pequena parte (e, mesmo assim, com alterações), entendi usá-la. Já fiz isso uma ou duas vezes, do blogue para a televisão, da televisão para o blogue ou o jornal.

Por outro lado, deliberadamente, quando me agrada uma ideia ou uma frase, ou uma determinada formulação de um problema (um vírus), esforço-me por a usar de forma complementar nos diferentes media, ou seja, infectar as pessoas com ela. Isto inclui o uso da “retórica” e da “sedução”. Como sempre tenho afirmado, não sou indiferente aos resultados do que digo ou escrevo, em particular quando versa matérias a que atribuo um significado cívico. Nas outras matérias, já considerações de eficácia têm pouca importância, ou os mecanismos dessa eficácia são de tipo diferente, narrativo, estético, etc..

Há, no entanto, uma distinção que queria fazer, sabendo que as fronteiras que ela enuncia são precárias e difíceis de definir: eu estou no “mercado das opiniões”, não no das “agendas”. Não são mutuamente incompatíveis, e pode-se sempre chamar agenda a qualquer intencionalidade da fala, mas é uma distinção que tenho vindo a compreender cada vez melhor. Noutra altura voltarei a falar disto, porque é aqui que as questões da análise, da objectividade, da propaganda, se podem colocar.

b) poderá a prévia edição num blogue servir de "balão de ensaio" para a publicação no jornal?

Sim, como se vê pelas respostas anteriores.


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© José Pacheco Pereira
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