ABRUPTO

11.9.03


MORTE DE ZÉ LUÍS NUNES

Já não o via há algum tempo, o Zé Luís Nunes, que conhecera em Direito em 1967. Era aquilo que os ingleses chamam um “character” , uma personalidade, um homem feito por si próprio e não pela imitação dos outros. O Zé Luís Nunes vinha de outros tempos. Sabia muita coisa, de Napoleão à gastronomia, e vivia naturalmente a bizarra combinação de ser portuense, monárquico, mação e hedonista. A seu tempo, o PS correu-o das listas de deputados.

Manuel Alegre descreveu os dois aspectos sobre os quais toda a gente falaria primeiro porque identificavam o Zé Luís Nunes sem hesitação. Um, o tique complicado com o nariz e que desafiava qualquer lógica da economia dos gestos, mesmo obsessivos. O outro, a sua idêntica obsessão com as questões militares, que o faziam mais militar do que qualquer militar. Lembro-me de ter com ele uma discussão sobre qual era o equivalente civil da continência, e o que é que se devia fazer quando passava a bandeira. Ele seguia a prática americana de colocar a mão no peito.

.Antes do 25 de Abril, ele era socialista e eu maoista e, na altura, isso era uma diferença abissal. Mas foi ao Zé Luís Nunes que deixei, nos tempos da clandestinidade, uma procuração para ser meu advogado, caso fosse preso. Nunca foi precisa, mas era uma prova de grande confiança e amizade, de um para o outro.

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© José Pacheco Pereira
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