leitores. Excertos de correio dos leitores, com que nem sempre concordo, mas que traduzem experiências, pontos de vista, informações que têm a ver com o que aqui se escreve
CONDIÇÃO DE CULPADO IDEAL: “SÓ OS HOMENS DE DIREITA BATEM NAS MULHERES…”
Raul Reis fala de duplicidades:
“Sigo bastante a actualidade francesa e alemã. Mas, em França, estou farto de ouvir falar da morte de Marie Trintignant. Era uma actriz que sempre achei simpática, mas nunca a coloquei em nenhuma galeria especial de actores franceses. As trágicas circunstâncias da sua morte permitiram-lhe uma projecção mediática póstuma inédita. Bertrand Cantat, o vocalista e líder do grupo Noir Désir, preso num cárcere de Vilnius, é objecto de todas as análises na praça pública. Amigos, jornalistas, colegas de ofício, todos são chamados a testemunhar sobre Cantat, sobre Trintignant e sobre a (curta) relação que o cantor e a actriz mantiveram.
O que me irrita não é que se fale deste caso. A violência doméstica - parece-me que é disso que se trata - é um flagelo que começa a conhecer as páginas dos jornais e a despoletar reacções dos políticos que buscam (difíceis) soluções. O que me preocupa - e, porque não dizê-lo, irrita - é o ar surpreendido, "abassourdido", dos comentadores que se espantam com o facto de um homem moderno, rebelde, "que sempre integrou os ideais de Maio de 68", seja capaz de espancar a namorada... até à morte. "Bertrand Cantat lutou pela causa palestiniana e bateu-se no mar alto com os activistas do Greenpeace", disse uma jornalista do Le Monde. "Cantat era um homem de esquerda, que desempenhou um papel importantíssimo na luta contra Le Pen, o que surpreende ainda mais que tenha feito isto", disse um outro comentador. Fiquei assim a saber que só os homens de direita batem nas mulheres. A amálgama entre a ideologia e a conduta social, ou a participação neste ou naquele movimento, atinge pontos altos no caso Cantat-Trintignant. E isso aflige-me, preocupa-me, a mim, que nunca me considerei de esquerda. Eu, sou, só por isso, suspeito à partida de todas as maldades do mundo, da violência doméstica à poluição dos mares e florestas. Eu que até separo o vidro, o papel e o plástico sou um culpado ideal para acusar de transgressões diversas; menos da droga porque essa ilegalidade imposta está reservada a uma esquerda sapiente. "
CONDIÇÂO DE EMIGRANTE
António João Correia escreve:
“Vivendo actualmente em Vancouver, British Columbia, Canadá, vejo de perto a forma miserável como o governo português trata – continua a tratar – os respectivos cidadãos que residem no exterior. Da prestação de serviços consulares medíocres, mal preparados, arrogantes, dispendiosos, temos de tudo um pouco. Pior, a questão sendo política estabiliza-se numa espécie de pacto de regime, mudando-se os governos e os serviços consulares continuando sempre sob o domínio de Kafka, do absurdo, da pior burocracia produzida por Portugal. Um bilhete de identidade leva meses (em média seis ou até mais se for preciso uma certidão de nascimento actualizada). Conheço um caso de um passaporte que levou nove anos. Como em redor da British Columbia não existe mais nenhum posto consular, quem viva no Norte da British Columbia ou em Alberta (são dezenas de milhar de portugueses) tem de perder vários dias para tratar de assuntos (…)banais.
Vejamos outro exemplo: em Vancouver existem 87 alunos na escola portuguesa. Bem, o governo português não só não paga aos professores, como ignora qualquer pedido de ajuda (…). Sãos os pais dos alunos – os últimos heróis que conheço do português – que pagam aos professores, pagando ainda as rendas das salas de aulas. De livros nem valerá a pena falar.
E, como estes assuntos não passam na «nossa» comunicação social, aqui fica o meu contributo.”
CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO
Miguel Mendes comentando a frase do Abrupto: "Os trabalhadores da Marinha Grande ou as operárias da Clark's não vão trabalhar para a construção civil ou como empregadas domésticas."
“Li esta afirmação no seu blog e (…) coloco uma questão: Porque não?
O desemprego aumentou (e vai aumentar mais) - situação que talvez esteja a alertar para a necessidade de trabalhar. Tinha necessidade de uma empregada doméstica e sempre foi difícil conseguir uma - na minha zona o subsídio de desemprego é uma forma de vida para muitas pessoas (tem uma duração de 2 anos).
Tendo sido encerradas algumas empresas deveria existir alguém disponível para trabalhar.... quase não consegui ninguém. As operárias, que não eram da Clark's mas de empresas similares, não queriam trabalhar como empregadas domésticas. Porque não? Simplesmente porque não precisavam. Agora começam a precisar e algumas já estão a trabalhar como empregadas domésticas.
Tenho o prazer de conversar com a minha funcionária entre a chegada dela e a minha saída para o trabalho e percebi que o medo dela era "servir" alguém. Agora que chegou à conclusão que ganha um salário honesto, ninguém a perturba no trabalho e conhece a arte (que pratica também em sua casa) já considera normal o trabalho doméstico.
Nos últimos tempos este é um exemplo que se tem repetido à minha volta. Os portugueses, infelizmente, não possuem conhecimentos nem bases de formação que nos permitam ser todos operários do conhecimento. Ainda podemos realizar trabalhos indiferenciados e ser respeitados como bons trabalhadores.
Sinceramente não me importo com a nacionalidade ou origem das pessoas. Pensei em contratar uma funcionária estrangeira mas alguém sabia que eu procurava uma funcionária e sugeriu a pessoa que trabalha em minha casa actualmente (estava à procura de trabalho).
Não acredito que sejam necessárias tantas pessoas estrangeiras para realizar trabalhos que pessoas que já cá estão podem fazer. Teria alguma empregada da Clark's problema em ser minha funcionária doméstica já que pago um salário (que não o mínimo), faço os descontos (inscrevo no regime geral se preferirem), trato bem as pessoas e almoçam, obviamente, o mesmo que eu? Creio que não... ou pelo menos não deveriam. Muitas pessoas começam a ver que existem trabalhos onde são necessárias e nenhum trabalho é menos digno desde que seja honesto e exercido com dignidade.”
Fátima Rebelo comenta a mesma afirmação, discordando:
“Apesar de concordar consigo no que respeita ao nosso Ministro da Defesa, no post afirma que os imigrantes não concorrem nos empregos na clarks e outras, pois os homens trabalham apenas na construção civil e as mulheres são invariavelmente empregadas domésticas.
Acontece que isso não é verdade de todo. Tenho raízes e uma ligação grande a uma região muito industrial (indústria do calçado e cutelaria) onde, nos últimos anos se tem assistido a um fenómeno em que mais de 50% dos trabalhadores desta indústria são trabalhadores vindos de leste.
Quero chamar a atenção para o facto de eu não ser de todo xenófoba nem ser contra a imigração. Mas olhando para os factos, eles são inegáveis.E é perfeitamente compreensível: os empresários (que não são os exploradores que por vezes se retrata e lutam diariamente para manter de pé a sua pequena indústria) deixaram de lutar com falta de pessoas disponíveis para este tipo de trabalho e de pagar horas extraordinárias infindáveis para passarem a ter um leque de trabalhadores disponíveis, qualificados, produtivos e, eventualmente não tão reivindicativos.
Em conclusão, os imigrantes (principalmente os de Leste) concorrem de facto com os portugueses noutras áreas que não a doméstica e construção civil. E é melhor começarmos todos a encarar esse facto em vez de enterrarmos a cabeça na areia e fingir que não se passa nada. Porque passa!
A solução não é o que defende o Dr. Portas e congéneres. Quanto a mim é necessário evitar que se criem anticorpos relativamente a estes trabalhadores pelas pessoas que são preteridas nos seus empregos, que é uma situação a que tenho assistido nos últimos tempos. E não é com discursos anti-imigrantes nem com a negação dos factos que se chega lá.”
CONDIÇÃO DE MAIS UMA VEZ ENGANADO
Mário Cordeiro mostra mais uma vez um exemplo de "rigor" nos jornais:
"É o Expresso de ontem, que nos diz, em letras "gordas e encarnadas", que, cito, "Grande Lisboa concentra quase metade da população em 2015". Ficamos aterrados - como é que vamos meter este "rossio" nesta "betesga"? Metade dos portugueses a viverem aqui, a estacionarem aqui, a fazerem compras aqui... por outro lado, que inversão súbita, numa cidade que se dizia "em estado de desertificação"...
Apanhado o primeiro "susto", lê-se a notícia que, afinal, reza o seguinte: "segundo as estimativas do estudo "Perspectivas da Urbanização do Mundo", da ONU, a Região de Lisboa e Vale do Tejo terá cerca de 45% da população portuguesa. Ah!
O "Lisboa", do título, absorveu a totalidade dos distritos de Lisboa, Santarém e Setúbal. Ah!. "Lisboa", afinal, segundo o Expresso, quer dizer Lourinhã ou Grândola, Coruche ou Santarém, Abrantes ou Cadaval, Chamusca ou Barreiro, Almada e Setúbal, Loures e Vila Franca de Xira, Cascais e Sintra. Torres Vedras e Torres Novas. Etc, etc, etc.
Sugiro ao Expresso um novo título: "No ano 2015, Portugal concentrará 100% da população residente em Portugal" - pode não ser muito informativo, mas pelo menos é mais rigoroso..."