ABRUPTO

21.6.03


A HISTÓRIA NO REINO DAS FRASES CURTAS

Paulo Agostinho escreveu-me de novo fazendo a ligação entre a discussão sobre a história e o império do soundbyte, explicando porque é que a “ história não cabe no Reino das Frases Curtas” :

Creio que o soundbyte está bem assimilado pelo público, pelo meu público (infantil) e pelo grande público (o que vê televisão preferencialmente a ler os jornais). De tal forma que muitos políticos o aceitam e orientam os discursos de forma a gerar um soundbyte, pois sabem ser esta a chave que lhes permite entrar em casa dos cidadãos, através da televisão. A escola (que como todas as instituições é conservadora), resiste a aderir ao soundbyte, mas é um esforço inglório. Ao professor é dada uma escolha: ou entra no "Reino das Frases Curtas" ganhando a atenção dos alunos e pondo de lado o rigor da explicação fundamentada, as nuances, os cinzentos que sombreiam toda a realidade, ou recusa-se a aderir ao soundbyte e perde o seu público. O trágico desta escolha é que em ambas as hipóteses o rigor da informação está ameaçado e a função de ensinar é substituída pela de entreter.

As frases curtas ficam no ouvido, são facilmente repetíveis em segundos de noticiário e insinuam uma realidade marcada por um dualismo reconfortante: há os maus e os bons, a direita e a esquerda (a ordem não é arbitrária, se estivermos atentos aos noticiários), os fumadores e os não-fumadores, os ortodoxos e os renovadores, os americanos e os inimigos da globalização, Israel e os palestinianos...
E a História no meio de tudo isto? A um público reconfortado por uma realidade a preto e branco e habituado à frase curta, como se pode pedir que goste de história, que pense sobre o seu passado e procure a partir dele explicar o presente?

No "Reino das Frases Curtas" o tempo é efémero. É o tempo da palavra falada. Quando muito, é o tempo da palavra impressa em papel de jornal cujo eco, como todos sabemos, soa por um dia ou por uma semana, no máximo. Uma sociedade que tem esta noção de tempo não pode, de modo algum, aceitar o conceito de tempo histórico. Recusa-se a aceitar que o passado seja a causa dos problemas do presente. Vejamos o exemplo do Iraque. A explicação para a intervenção americana encontra-se no petróleo (que é o presente, existe, está lá, provavelmente prestes a cair nas garras das petrolíferas americanas) e não no terrorismo do 11 de Setembro (que é passado). A 12 de Setembro ainda se aceitava dizer "Somos todos americanos" (belo soundbyte), mas tanto tempo depois o eco já não se ouve. Ou melhor, ouve-se, mas não no "Reino das Frases Curtas".



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© José Pacheco Pereira
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