ABRUPTO

15.12.12


ESPÍRITO DO TEMPO: HOJE 


Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM) 


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DEZ TENDÊNCIAS PARA 2013



1.De mal a pior - Esta é a mais sólida tendência para 2013. Tudo o que está suficiente será medíocre. Tudo o que está mau ficará pior. Pobreza, desemprego, economia, dívidas, falências, direitos, liberdades, garantias, corrupção, ataques à democracia.


2. O "exercício" vai ter maus resultados - O primeiro-ministro chama "exercício" à governação, incapaz de escapar a uma mescla de economês com a linguagem escolar que o caracteriza. O "exercício" é o Orçamento, no "país de programa" que é Portugal. A devastação intelectual do vocabulário corrente no poder é apenas mais um sinal do nosso empobrecimento, da impregnação do espaço público por um vocabulário de má consultora. Mas como vai ser possível insistir no mesmo quando o "exercício" falhar? Vai. Vai, porque eles só sabem fazer isto e não sabem o que fazem. O país corre o risco de ser entregue aos que se seguem em muito pior estado do que foi recebido em 2011. Em Paris vai haver um aprendiz de filósofo que se vai rir. Sem desculpa.


3. Haverá novos planos de austeridade - Tão certo como dois e dois serem quatro. O primeiro chama-se pomposamente "refundação do Estado" e recairá directamente em cima dos funcionários públicos e dos pensionistas e indirectamente sobre os portugueses que mais precisam dos serviços públicos, educação, saúde, Segurança Social. Será anunciado em Fevereiro como um plano aberto para discussão até Agosto, mas tudo já está decidido: cortar quatro mil e 500 milhões de euros permanentemente. Depois, em seguida, haverá novos planos de austeridade, sempre que os números do "exercício" falharem. 


4. A Grécia aqui tão perto - A situação grega caracteriza-se, em linhas muito simples, pela conjugação de números de "contabilidade criativa" apresentados a Bruxelas desde a entrada no euro, pela instabilidade política e maiorias muito frágeis, pela incapacidade de os governos cumprirem o que acordam com a Comissão, o BCE e o FMI, por uma dívida gigantesca, pela inexistência de uma fiscalidade eficaz, por muita corrupção, pela turbulência na rua, manifestações em série e greves, pela existência de lóbis e corporações poderosas e pela quebra maciça do poder de compra da população e crescimento da pobreza exponencial nos últimos anos de "programa".
Em que é que Portugal é diferente, ou vai a caminho de ser diferente? Números criativos existiram nos últimos orçamentos Sócrates, embora numa dimensão mais benigna. Instabilidade política é menor em Portugal, mas a coligação é uma ficção muito frágil. A dívida é igualmente gigantesca em Portugal e está a aumentar. O incumprimento do acordado com a troika no défice, o aspecto central do "ajustamento", é total. A nossa fiscalidade tornou-se mais eficaz na última década, mas pouco pode fazer contra a fuga generalizada aos impostos, por fraude ou por absoluta necessidade. A economia paralela está a crescer. As ruas portuguesas são mais calmas do que as gregas, mas uma minoria violenta começa a aparecer. Uma quebra maciça do poder de compra da população e o crescimento da pobreza exponencial nos últimos anos de "programa" existe em Portugal numa dimensão semelhante à grega, com tendência para ser igual em 2013-4. A corrupção grega e portuguesa atingem extractos diferentes da população, a nossa tende hoje a ser mais da "alta", mas no seu conjunto está a agravar-se. Na verdade, muitos números são piores na Grécia do que em Portugal, mas não parece haver nenhuma diferença qualitativa entre as duas situações. A tendência é para Portugal ficar cada vez mais "grego" à medida que o tempo passa.


5. Vai tudo parar aos tribunais - Em 2013, tudo vai parar aos tribunais com uma intensidade até agora nunca vista. Autarquias, sindicatos, políticos, grupos de cidadãos, indivíduos vão invadir os tribunais, dos tribunais comuns ao Tribunal Constitucional, com queixas e reivindicações sobre atropelos, direitos, garantias, abusos, que o Governo, o Estado, a maioria, tem vindo a fazer. Desde decidir se é legítimo a candidatos apresentarem-se a eleições após mais de três mandatos até à extinção de freguesias, ou à equidade orçamental, rendas, avaliações, IMI, IRS, impostos, direitos laborais, violações da lei, violação de contratos, etc., tudo vai parar aos tribunais. É um processo muito arriscado e delicado: por um lado, ameaça politizar os tribunais; por outro, representa a ultima instância que pode garantir direitos e garantias e combater injustiças e ilegalidades por parte do Estado e do Governo.


6. O PS continua no limbo - Enquanto o PS tiver à sua frente António José Seguro, e for aquilo que é, Seguro estará para Passos Coelho como Passos Coelho esteve para Sócrates. Do mesmo modo que Passos Coelho e Relvas, frutos do aparelho, descaracterizaram o PSD como partido social-democrata, e Portas faz equilíbrios no arame para o mesmo não acontecer no CDS como partido democrata-cristão, Seguro transformou o PS numa coisa amorfa e mole, sem sentido nem direcção. Isso significa que a sua governação será muito semelhante à de Passos Coelho em três aspectos fundamentais: trará o aparelhismo para o Estado, será subserviente face aos poderes fácticos, em particular a banca, e será muito incompetente. Como isso não entusiasma ninguém, poderá lá chegar apenas pelo mesmo fenómeno de rejeição do anterior Governo que levou lá Passos Coelho. Mas um remake é sempre pior do que o original, e o PS caminha para um desastre mais anunciado e rápido do que o PSD em 2011.


7. A coligação não é uma coligação é um ajuntamento de conveniência - A coreografia da diferença e demarcação que deputados e governantes do CDS fazem todos os dias, a começar por Portas, é penosa de se ver. Quando discursam é para elogiar ministros do CDS, quando se calam é para abafar com o seu silêncio a discordância activa que mantêm com Passos Coelho e Gaspar. Não vai acabar bem, mas também já não está bem de todo. 


8. O que sobra das nossas Forças Armadas não vai servir para nada - A "refundação do Estado" vai atingir ainda mais as Forças Armadas, o que é facilitado pela nula empatia dos governantes vindos das "jotas" pela instituição militar e pela crescente deslegitimação da própria existência de forças militares. Como a cada corte elas se tornam mais frágeis, aparecem cada vez como mais inúteis, e perdem razões de existência. Um dia, quando Portugal precisar de concorrer a um comando estratégico para os nossos interesses nacionais, ou defender a nossa ZEE, vai ver o que lhe falta, mas será tarde.


9. Os negócios entre a elite no poder vão continuar frutuosos - O nosso establishment do poder, partidos - sector financeiro -, administração superior e Governo, vai continuar a fazer o que sempre fez. A forma como o faz muda, havendo agora uma centralidade do sector financeiro correlativa da maior fragilidade dos outros sectores económicos. A banca é hoje parte inteira da governação, definindo activamente os limites das decisões governamentais e detendo um efectivo poder de veto. As privatizações e o "ajustamento" são enormes oportunidades que estão a ser aproveitadas. Elas permitem também alguma circulação das elites, entre a área governamental, essa importante plataforma de intermediação que são as sociedades de advogados e as consultoras, e os lugares de confiança nas grandes empresas. Aqui dominam as personalidades com fortes ligações à política que vivem na órbita dos partidos, mas acham que lhes são superiores. Os aparelhos partidários estão por regra na parte intermédia e baixa da cadeia alimentar, mas estão bem aí ancorados. Nos partidos, o acesso ao poder continua a permitir a constituição de empresas cujo objectivo é usufruir das ligações privilegiadas para obter fundos e benesses. Antes era a área da formação a mais importante, hoje isso faz-se à volta de empresas de comunicação, marketing, assessoria e consultadoria, mas o esquema é o mesmo.


10. O "bom povo português" vai ficar mau - A razão é muito simples: não aguenta. Nem vale a pena perder tempo e palavras com isto. Está escrito nas estrelas. 

(Versão do Público de 8 de Dezembro de 2012.)

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14.12.12



ESPÍRITO DO TEMPO:  HOJE
 
 
Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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COISAS DA SÁBADO

CARIDADE E SOLIDARIEDADE 

Evitei entrar na primeira polémica resultante das palavras de Isabel Jonet, embora não tivesse nenhuma dúvida sobre o seu significado “mental” e sua história. Mas Jonet faz uma obra de mérito, e a obra vale mais do que a “teoria”, pelo que alguma moderação era exigida. Há casos em que apesar de se pensar mal, se faz bem. Não abundam, mas existem. Mas, como disse, não tinha qualquer dúvida de que memória é que vinham as suas afirmações, que seriam sensatas se não fossem ditas no contexto da actividade caritativa e do actual discurso governamental sobre como “os portugueses vivem acima das suas posses”. Vinham de ideias como as que caracterizaram cinquenta anos de pensamento sobre a pobreza em Portugal, expressas na frase brutal, mas actualíssima, “leve lá uma esmola, mas não gaste em vinho”. 

POLITIZAR A CARIDADE 

Jonet em vez de ter percebido o mal que está a fazer à sua própria obra, – e que, como é óbvio, não pode ser medido pela contribuição generosa dos portugueses, que também sabem fazer distinções, - resolveu insistir e teorizar. Está com isso a politizar no pior sentido a actividade do Banco Alimentar e a prejudicar o esforço da única instituição que a nível nacional actua com genuíno sentido de “caridade”, a Igreja. Quem escreve estas linhas propôs, em tempos ainda socráticos, que os fundos que o estado disponibiliza para a assistência fossem atribuídos a instituições da Igreja que sabem muito melhor a quem eles devem chegar e com maior eficiência. E não mudei de opinião. Tenho porém poucas dúvidas que algumas das pessoas mais preocupadas com a crescente politização do discurso de Jonet são os bispos, que conhecem a realidade portuguesa muito melhor: no aspecto assistencial, social e político. E sabem o papel que teve a doutrina social da Igreja na transição da caridade para a solidariedade, da evolução da assistência paternalista para os direitos sociais. 

Para não ir mais longe, Sá Carneiro não só perceberia de imediato o que Jonet está a dizer, como o recusaria sem dúvidas em nome da sua formação humanista e religiosa, as duas. Sá Carneiro, e isso ficou inscrito no programa original do PSD, valorizava o papel que a dignidade humana tinha e, se não reduzia o “homem”, na sua dimensão transpolítica, ao conceito de “cidadão”, também não substituía os direitos pelas benesses da caridade, por muito dedicadas e esforçadas que sejam. A caridade é para quem precisa e muito, mas a solidariedade social é um fundamento do estado moderno, pensado por democratas-cristãos e social-democratas. E os direitos “adquiridos” são uma identidade da “melhoria” colectiva das sociedades, fruto da justiça social e dadores de dignidade e de liberdade. 

 SUBSTITUIR DIREITOS PELA ASSISTÊNCIA 

O que Jonet disse ao i foi o oposto. Valorizou a caridade no sentido tradicional cristão, o que em nada me choca. A semana passada usei a mesma palavra nesta coluna, no mesmo exacto sentido de “agape”, para falar da obrigação que sentia de escrever sobre a crise. Mas não parto daí para a ideia que se deva contrapor a caridade à solidariedade, a boa vontade voluntária do “amor” assistencial face à obrigação social do estado. É o que Jonet diz: 
A solidariedade é algo mais frio que incumbe ao Estado e que não tem que ver com amor, mas sim com direito adquiridos. (…) Sou mais adepta da caridade do que da solidariedade social… 
 Na verdade, a “caridade” não é “quente” devido ao “amor”, face ao “frio” da solidariedade do estado, porque não são a mesma coisa, a não ser que a caridade cometa o pecado de se vangloriar de si mesma, ou seja, assumir uma vaidade mundana, e violar o preceito bíblico de que “não saiba a tua mão esquerda, o que faz a direita”. Então a caridade deixa de ser “amor” para ser uma proposta política de organização da sociedade. 

 Este tipo de comparações levariam a uma sociedade em que a exclusão seria institucionalizada como poder, em que os problemas sociais seriam resolvidos pela dádiva dos mais ricos aos mais pobres, o que contém implícita uma ideia sobre o poder “natural” da sociedade e sobre a relação paternalista entre os que têm e os “seus” pobres, a quem, no passado ainda próximo, o diminutivo colocava no lugar, os “pobrezinhos”, crianças grandes, pobres mas “honrados”, nas suas casinhas humildes, mas limpas. Este tipo de ideias sobre a pobreza são ofensivas da dignidade humana e implicam uma relação humilhante entre quem dá e quem recebe, em particular quando a caridade se mistura com “conselhos” de como se deve viver, uma arrogância moral insuportável face a quem não pode viver como queria. “Leve lá uma esmola, mas não gaste em vinho”. 

POBREZA E VERGONHA 

Por que é que as pessoas “escondem” a sua pobreza quando caiem nela? É porque recorrer à caridade pode ser uma necessidade imperiosa, mas é uma perda de dignidade social e humana, uma humilhação. É uma “vergonha”. É por isso que quem em política pensa como Jonet, tende a desvalorizar o imenso sofrimento que a crise está a provocar, nas suas dimensões psicológicas e humanas, muito para além das necessidades básicas de casa, comida, luz, água e transportes, medicamentos e roupa. Porque quando é assim, e é o que Jonet anda a fazer com as suas declarações, elas não são sobre a caridade, mas sobre a sociedade e a política e devem ser discutidas como tal.

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EARLY  MORNING BLOGS   
 
2283

It is better to leave a vessel unfilled, than to attempt to
carry it when it is full. If you keep feeling a point that has been
sharpened, the point cannot long preserve its sharpness.

When gold and jade fill the hall, their possessor cannot keep them
safe. When wealth and honours lead to arrogancy, this brings its evil
on itself. When the work is done, and one’s name is becoming
distinguished, to withdraw into obscurity is the way of Heaven.


(D.H. Lawrence)

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13.12.12


ESPÍRITO DO TEMPO:  HOJE
 
 
Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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EARLY  MORNING BLOGS   
 
2282 - Ludwig van Beethoven's Return to Vienna
 
Oh you men who think or say that I am malevolent, stubborn, 
or misanthropic, how greatly do you wrong me....
 The Heiligenstadt Testament

Three miles from my adopted city 
lies a village where I came to peace.
The world there was a calm place, 
even the great Danube no more 
than a pale ribbon tossed onto the landscape
by a girl's careless hand.  Into this stillness 

I had been ordered to recover.  
The hills were gold with late summer;
my rooms were two, plus a small kitchen, 
situated upstairs in the back of a cottage 
at the end of the Herrengasse.  
From my window I could see onto the courtyard 
where a linden tree twined skyward — 
leafy umbilicus canted toward light, 
warped in the very act of yearning —
and I would feed on the sun as if that alone 
would dismantle the silence around me.

At first I raged.  Then music raged in me,            
rising so swiftly I could not write quickly enough 
to ease the roiling.  I would stop 
to light a lamp, and whatever I'd missed — 
larks flying to nest, church bells, the shepherd's 
home-toward-evening song — rushed in, and I
would rage again.  

I am by nature a conflagration; 
I would rather leap 
than sit and be looked at.
So when my proud city spread  
her gypsy skirts, I reentered,  
burning towards her greater, constant light.
 
Call me rough, ill-tempered, slovenly— I tell you, 
every tenderness I have ever known 
has been nothing 
but thwarted violence, an ache 
so permanent and deep, the lightest touch 
awakens it. . . . It is impossible 

to care enough.  I have returned 
with a second Symphony 
and 15 Piano Variations
which I've named Prometheus,
after the rogue Titan, the half-a-god 
who knew the worst sin is to take 
what cannot be given back.

I smile and bow, and the world is loud.  
And though I dare not lean in to shout 
Can't you see that I'm deaf? —
I also cannot stop listening.
(Rita Dove)

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10.12.12



PONTO DE NÃO RETORNO

 Há um aspecto desta crise que está longe de ser enunciado e analisado: é que ela é para milhões de portugueses um ponto sem retorno. Ou seja, nunca mais vão deixar o nível de pobreza em que estão a ser mergulhados. Mesmo que possa haver a prazo médio ou longo alguma recuperação económica e do emprego, não será para eles, nem no seu tempo, nem nas suas oportunidades. Para estes é que, em primeiro lugar, a crise é mais trágica, definitiva, cruel. E não há nem uma palavra, nem uma acção que os possa salvar. 

Estou a falar das pessoas e das famílias que o desemprego, os impostos, os salários e o custo de vida vão atirar para a linha abaixo da pobreza. Como é que a vão ultrapassar de novo na sua vida útil? Sim, na sua vida útil, que é o que conta. Vai haver emprego para os actuais desempregados? Nunca, jamais, em tempo algum, podem esperar voltar a ter emprego. Se alguma recuperação existir no emprego, será muito pequena e favorecerá os mais novos, e novos aqui é na casa dos vinte anos. Vão conhecer uma vida mais barata, preços mais baixos da renda, da luz, gaz, água, transportes? Nunca, jamais, em tempo algum, tal é previsível nas próximas décadas. Vão poder por milagre pagara as suas prestações e dívidas? Com que dinheiro? Vai diminuir a carga fiscal? Talvez daqui a cinco, dez anos, na melhor das hipóteses, mas sempre pouco. Os impostos têm a característica de se instalarem para a eternidade. Os estragos feitos em 2013, 2014, são para já suficientes para destruírem milhares de pequenas empresas e lançarem na insolvência milhares de família. Como é que se volta atrás? O governo não sabe como, nem quer saber. É o “ajustamento”.

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SUBSTITUIR DIREITOS PELA ASSISTÊNCIA

Para esses portugueses, há que substituir direitos, essa coisa dos proto-comunistas, mal habituados ao seu salário e ao seu contrato, por caridade púbica, assistência social e comida do Banco Alimentar. É assim que eles estão bem, impossibilitados de se defenderem, face a um governo que quebra os contractos unilateralmente com os mais fracos, usa o seu dinheiro descontado nos salários para a reforma a seu belo-prazer, domados na sua dignidade e envergonhados de si próprios. E a cada acto público de caridade, têm que ouvir essa ancestral frase: “leva lá essa esmola, mas não gastes em vinho”.

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VINGANÇA 

Eu sei bem o peso semântico de uma palavra como vingança, mas não posso escapar-lhe. Quando lemos e ouvimos o actual discurso do poder, em toda a sua extensão, do primeiro-ministro, da maioria dos governantes (nem todos), do establishment do poder aos blogues serventuários, à escrita e ao comentário de bajulação e de legitimação, percebe-se um tom revanchista que transpira por todo o lado. Pode ser a pretexto de Sócrates, do PS, dos grevistas, dos estivadores, dos funcionários públicos, do Estado, dos que querem continuar “como dantes”, dos que “tem direitos a mais”, dos que querem esconder-se atrás do “escudo de uma Constituição obsoleta”, dos que não querem sair da sua “zona de conforto”, mas é na verdade sobre Portugal e os portugueses que se usa esse tom. Os portugueses têm de mudar de vida pela pobreza e pela virtude, pelas ideias simples e rudimentares de quem nunca passou de vagas e ignorantes noções obtidas pelas modas nos media e nos blogues, alicerçada depois pela vaidade das companhias “certas” dos grandes do mundo. Por isso, o espírito de vingança está lá, contra os portugueses que apanharam todos no maior charter do mundo e foram ao México passar férias em Acapulco, andar de sombrero, ouvir mariachis e beber tequila e por isso devem ser agora punidos colectivamente por um retorno à pobreza purificadora.

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ESCAPISMO 

Não há nesta matéria um “bom” escapismo, só escapismo. E o escapismo ajuda os poderosos a legitimarem aquilo que é ilegítimo: uma espécie de vingança colectiva contra a maioria dos portugueses, tidos como culpados dos desmandos dos seus governantes, por egoísmo, por pieguice, por que não tem espírito de empreendedores, porque estão habituados ao bom e ao melhor e a viverem “acima das suas possibilidades”.

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ESCREVER SOBRE A CRISE 


Estamos todos fartos de escrever sobre a crise, e eu em particular. Mas existe uma certa obrigação ética e “crítica” em fazê-lo, até porque isso é uma obrigação de comunhão e testemunho com os nossos concidadãos e com a nossa comunidade. Repare-se na abundância do prefixo “co”, com. É isso mesmo. Esta é uma obrigação que não é apenas racional, não emana da verificação de haver boas ou más políticas, e da sua identificação crítica, mas emana de um domínio afectivo de se querer “estar com”. Se o nosso catolicismo não estivesse tão impregnado de hipocrisia, e a palavra não estivesse adulterada pelas piores práticas, é isso que significa “caridade”, o “agape” dos gregos, a que se soma o “testemunho”. Esta última palavra tem uma origem que pode surpreender muita gente, - vem de “testículos”, - e num certo sentido agora é que se vai ver quem os tem ou não tem. Esta combinação serve-me e obriga-me a continuar a escrever sobre a crise. 

(Continua.)

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  HOJE DE NOVO 
Foi publicada a primeira nota sobre as eleições autárquicas de 2013 (CDS de Torres Vedras), numa altura em que várias pré-campanhas já estão em curso. Nas eleições de 2009, o EPHEMERA publicou materiais de mais de dois terços dos concelhos, a maior cobertura jamais feita na Rede e fora dela de umas eleições deste tipo,  muito difícil dada a dispersão geográfica e a diversidade de candidatos, partidos e campanhas independentes. Foi um esforço colectivo em que participaram cerca de 100 amigos do EPHEMERA de todo o país. Muitos materiais de 2009 estão ainda por publicar, assim como muitos outros de campanhas anteriores existentes em arquivo. Vou tentar garantir a publicação de maior número desses materiais antes das eleições de 2013 (já foi feito para os Independentes de Tomar, o PS em Ovar, várias freguesias de Vila Nova de Gaia, o PS e o CDS de Vila Real), mas RENOVO DESDE JÁ O APELO A TODOS OS AMIGOS E COLABORADORES PARA  SE COMEÇAR A RECOLHA.
 
Notícias sobre um importante espólio:

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EARLY  MORNING BLOGS   
 
 2281

« Révolution : c’est retourner le sablier. » 

(Jean Dubuffet)

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9.12.12


ESPÍRITO DO TEMPO:  HOJE
 
 
Passagem do tempo por um banco do jardim de S. Amaro. (RM)

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© José Pacheco Pereira
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